domingo, 30 de agosto de 2009

sábado, 29 de agosto de 2009

M21 - VIAGENS NO TEMPO

VIAGEM NO TEMPO 1

1922 – Uma primeira pedra…

Diz-se de alguns livros que,depois de terem sido publicado, está tudo dito.

O assunto de que trataram está esgotado! Não se pode fazer melhor.

Os seus autores foram tão brilhantes que… não vale a pena voltar ao tema.

Em relação a “Alcobaça” já o ouvimos referir (por pessoas de grande valor intelectual) que, depois do “SEIVA SAGRADA”, de Pedro G. Barbosa e Maria da Luz Moreira - editado em Março de 2006 pela Associação dos Agricultores da Região de Alcobaça - já não há mais nada a escrever sobre… Alcobaça. Já lá está tudo.

No que respeita a São Martinho do Porto o livro “A BAÍA DE S.MARTINHO DO PORTO – Aspectos Geográficos e Históricos”, com coordenação de Maria Cândida Proença e Edição Colibri/Associação de Defesa do Ambiente de S. Martinho do Porto, em Abril de 2005, está também nesse invejável patamar.

Por razões várias, nomeadamente familiares, somos um apaixonado por S. Martinho do Porto e lemos (e relemos), sem nunca nos fatigarmos, o “tal livro” que teve a coordenação de Maria Cândida Proença e cujos autores foram Virgínia Henriques, Iria Gonçalves, Manuela Santos Silva, Paula Lourenço, Luís Silva e António Ferreira Lamas.

Em passado recente num sub capítulo designado por “Os grandes projectos falhados”, algumas linhas, a páginas 122, pareceram-nos familiares e responderam (finalmente) a uma interrogação que já nos acompanhava há alguns meses. Mas não nos queremos adiantar ao “cerne” da questão…

O que está escrito a páginas 122: «… Em Setembro de 1922, a Ilustração Portuguesa noticiava que, em S. Martinho do Porto, fora dado um chá a bordo do torpedeiro Ave, na ocasião de ser lançada a primeira pedra para um monumento a erigir, comemorativo do glorioso feito da travessia aérea do Atlântico.
Na ocasião do lançamento da primeira pedra do singelo monumento, um padrão de homenagem a Gago Coutinho e Sacadura Cabral, o Bispo de Leiria rezou missa nas ruínas da Capela de Sant’Ana, junto da qual se iria localizar o monumento, projecto de Perfeito Magalhães.
A cerimónia contou com a presença do Ministro da Marinha, oficiais de terra e mar, muitas senhoras e muito povo. A capela iria em breve ser reconstruída. Apesar desta cerimónia, também este projecto não vingou e as ruínas da capela vão-se degradando progressivamente.»
Voltando um pouco atrás é agora tempo de pôr o leitor ao corrente da “interrogação” que trazíamos “em carteira”.

O nosso amigo e colega dos tempos do Colégio do Dr. Cabrita, o advogado de Alcobaça, António Vergas Alexandre, tinha-nos emprestado uns documentos que referiam a “tal” primeira pedra de 1922 mas… a notícia ficava por aí.

Havia “início” mas não havia “fim” para a história.

A nossa interrogação em relação ao Monumento a Gago Coutinho e Sacadura Cabral estava finalmente respondida.

Afinal a“pedra” de 1922 tinha sido… a primeira… e única.

Reproduzimos seguidamente os documentos do nosso amigo Vergas Alexandre que afinal só confirmam como o livro “A BAÍA DE S.MARTINHO DO PORTO – Aspectos Geográficos e Históricos”, está no tal patamar de “excelência”.

O artigo da Ilustração Portuguesa (2ª. Série, Nº.866, de 23 de Setembro de 1922) era assinado por M.Duarte Lopes, sendo os “Clichés” da responsabilidade de Foto-Palace.

Não resistimos à tentação reproduzir a parte final do artigo de M.Duarte Lopes em português rebuscado, próprio da época, mas sem dúvida saído de uma pena inspirada. Escrevia-se então assim: «Tarde em fóra, o sol não longe do ocaso, realizou-se a cerimónia comovente do lançamento da primeira pedra do padrão de gloria racica – projecto de Perfeito de Magalhães que, em linhas simples, conseguiu evocar a magestade do vôo temerário dos hodiernos argonautas.
O venerando antistite da cidade do Liz pronunciou palavras de patriotismo e crença; transportou-se ao tempo das caravelas de audácia e gloria, e evocou a época distante em que Portugal pairava n’uma ambição de justo poderio… O representante do Governo, o comandante Couceiro, reforçou, comovido, as palavras do principe da Egreja e, na sua eloquência serena, em que vibraram o amor pátrio e a fé nos destinos de Portugal, ergueu também, como que um hino de esperanças, emprestando mais realce ainda àquela emocionante festa de patriotismo e crença.»

E chegamos ao fim desta viagem do tempo.

O monumento da “gloria racica” não se concretizou mas São Martinho do Porto não deixou de homenagear Carlos Vilhena GAGO COUTINHO e Artur Freire SACADURA CABRAL.

A “pedra” de 1922… acabou por não se perder inteiramente e poderá estar a “amparar” as placas das “Ruas” com os nomes dos imortais heróis da 1ª. Travessia aérea do Atlântico Sul, entre Lisboa e Rio de Janeiro.

JERO

VIAGEM NO TEMPO (2)

Guiné: uma diligência interrompida porquê?

«... No dia 29 de Junho de 1973, sábado, surgiu o inesperado: três helicópteros são detectados em aproximação à pista e simultaneamente uma mensagem faz saber que está a chegar o General Spínola.

Havia já vários meses que nenhum meio aéreo tinha sido visto em Cuntima (aquartelamento junto da fronteira norte da Guiné com o Senegal), excepto para raras acções de evacuação consequência das medidas preventivas contra a utilização do míssil terra-ar pelo PAIGC.

… A aterragem dos helicópteros foi festa.

General Spínola

Para mim encarei com certa apreensão a visita do Comandante-Chefe.
A (anterior) Operação Guidage, embora já tivesse dado origem a referências especiais e muito elogiosas, não estava para mim terminada. Aguardava a oportunidade para explicações e não me tinha preparado para a discussão que previa fosse muito dura.

Eis senão quando o Comandante-Chefe desembarca sorridente… dispensa o questionário que lhe era habitual nas visitas aos comandos operacionais e… pediu apenas para ficarmos a sós no gabinete do comandante de companhia.

… No tom mais cordial que imaginar se possa contou-me o que tinha sido a sua acção desde que chegara à Guiné, nos contactos com o Presidente Senghor, os contactos com os comandos do PAIGC nos tempos de Amílcar Cabral e as suas diligências na interferência da escolha do próximo Secretário Geral do PAIGC , cuja eleição ia ocorrer dentro de dias.

… Muita novidade para mim. Porquê esta abertura? Porquê esta abordagem de temas tão secretos, comigo que não pertenço ao tal círculo?

Regresso a Bissau

… Fiquei meio atónito quando o General, que continuava bem humorado, se despediu de todos e regressou a Bissau.

Sempre considerei que em matérias classificadas, não se deve fazer pressões nem usar habilidades para conhecer mais do que aquilo o superior entenda poder e dever dizer. Por isso não fiz perguntas… mas não encontrava explicação para esta visita nem resposta para as perguntas que a mim próprio punha. A dúvida mantinha-se no meu espírito.

Agente de Informações

… Mas eis que no dia seguinte, 30 de Junho, domingo, cerca do meio-dia me procura um indivíduo fula, não guinéu, que eu conhecia desde que assumira o comando do sector por contactos estabelecidos em Farim. Era um agente de informações com nome de código Padre, ao que se sabia pertencente ao Front da Guiné-Conakri e com especial aceitação no Comando-Chefe.
… Tinha formação de curso superior e falava apenas em francês e fula. Era bastante culto e muito correcto no trato. Em obediência ao meu princípio de respeito pelo serviço de informações, fui, a pouco e pouco, ganhando a sua confiança e até a sua amizade.

Mensagem relâmpago

Foi por força desta mútua confiança que ele agora me procurou e pediu que fizesse uma mensagem relâmpago par Bissau solicitando a presença do General Spínola nesse dia, ali em Cuntima, para um contacto com alguns dirigentes do PAIGC.

Pareceu-me, agora, perceber o que se passara na véspera.

Acedi ao pedido.

Por volta das 14.00 horas é recebida a resposta de Bissau. Pretendia o Comandante-Chefe explicações de pormenor.

Fez-se, rapidamente novo texto, um pouco mais explícito.

Cerca das 16.00 horas vem a resposta à segunda mensagem: aquela hora já não se podia fazer a deslocação porque o regresso não era possível antes da noite e os helicópteros não estavam preparados para isso.

Foi um balde água fria para o agente;… era, segundo dizia, todo o esforço perdido, o seu crédito junto do PAIGC abalado e, provavelmente , a impossibilidade de preparar um novo encontro. Não escondia o seu nervosismo. Pedia-me que o ajudasse, mas não concretizava a ajuda que queria.

… - Acha que eu posso substituir o General –perguntei em tom jocoso por supor que não tinha sentido resposta afirmativa.

- Mas o coronel vai? É que eu não me atrevia a pedir, mas é mesmo essa a única hipótese de salvar a situação criada pela recusa do General Spínola.

… - Nós estamos proibidos de contactos deste género mas porque confio em si aceito ir.

800 metros para lá do marco nº.104…

… Eram cerca de 18.00 horas. Chamei o Capitão Vale e expus-lhe resumidamente o que se passava.

Recomendei-lhe que no final do jantar enviasse dois grupos de combate para os lados da fronteira na missão habitual de segurança afastada… a missão teria por finalidade actuar contra qualquer emboscada de que eu viesse a ser vítima e, se necessário, desenvolver uma acção de retaliação.

O Capitão Vale... entendeu rapidamente e perguntou-me apenas se o autorizava a acompanhar-me.

Disse-lhe que sim.

Simulámos ir à caça, montámos numa viatura e seguimos pela estrada cerca de 800 metros. Depois apeámos e dirigimo-nos ao marco nº. 104 da fronteira.

Encontro no Senegal

Aguardámos. Passados alguns minutos vem alguém do outro lado, de bicicleta, informar que o interlocutor está dentro do Senegal, receia vir até nós e solicita que nos desloquemos nós.

… A noite estava cerrada. Na nossa frente viam-se luzes de uma povoação senegalesa, já próxima. Caminhávamos em silêncio. Chegámos ao local indicado…cerca de um quilómetro dentro do Senegal, quando se notou a aproximação de um automóvel que parou a duas centenas de metros. Saíram dois indivíduos que se dirigiram a pé para nós.

Era o interlocutor.

O agente fez as apresentações e eu estendi-lha a mão – o que, segundo soube mais tarde, o sensibilizou muito. Tratava-se do representante pessoal do Comandante Geral das forças do PAIGC.

Proposta… para uma Guiné melhor

- Não venho tratar de assunto pessoal nem de grupo restrito. Trata-se sim de um problema que diz respeito a todos os combatente do PAIGC. Andamos já há dez anos nesta luta. Somos agora menos do que quando começámos.
Actualmente não nos entendemos com o escalão político: eles são cabo-verdianos e comunistas; nós somos guinéus, combatentes e não comunistas. Desejamos apenas uma Guiné melhor. Já chegámos à conclusão de que, sozinhos, não somos capazes de o fazer, mas sê-lo-emos convosco.
A nossa proposta é muito simples: em dia e hora que se combine acaba a guerra, nós seremos integrados nas forças da Guiné, sem recriminação nem vingança; e depois, juntos, faremos a Guiné melhor. Tudo isto tem que ser combinado em curto espaço de tempo e com o maior segredo, porque se for descoberto antes do tal dia e hora terei a mesma sorte que outros companheiros meus já tiveram.

A caminho do Palácio do Governo em Bissau.

Regressámos alvoroçados. Teríamos nós o privilégio de ser os intermediários e os primeiros intervenientes num processo que levaria a um próximo fim da guerra com honra para ambas as partes?

Mal dormi, ansioso pela madrugada, pelo regresso a Farim, pelo avião dessa 2ª. feira que me levaria a Bissau, pelo encontro com o General Spínola.

Em 18.50 horas do dia 1 de Julho de 1973 quando cheguei ao Palácio do Governo em Bissau.O Capitão Ayala, ajudante do Governador, atendeu-me. Disse-lhe que tinha urgência em falar com o General Spínola. Os minutos contavam, o que ajudou a ultrapassar algumas dificuldades.
O General recebeu-me de imediato.

A conversa não começou bem quando lhe dei conhecimento que tinha ido ao contacto que estava preparado para ele.

- Então o senhor não sabe que proibi todos os contactos, não sabe o que aconteceu aos três majores ? Atalhou o General irritado ,levantando-se e crescendo para mim.

Mantive-me sentado, cruzei as pernas e retorqui:

- Sei e até era muito amigo de dois deles, mas entendi que era meu dever ir e fui.

- Espere lá, mas afinal você esta aqui; conte lá.

E sentou-se para ouvir o resumo que lhe fiz da conversa e das propostas do interlocutor do PAIGC.

O General voltou a levantar-se, agora com entusiasmo, abraça-me ao mesmo tempo que diz.

- Mal sabe o alto serviço que acaba de prestar à Nação!

- Ainda bem. Estou feliz por isso.

Dirige-se ao telefone ,liga para Lisboa e e ouvi-lhe dizer o seguinte:

- Alas? (era o chefe da DGS em Bissau) Está bem?. Tome o avião amanhã e venha aqui.

O General agradeceu-me de novo. Vai sair para uma reunião mas faz questão que o acompanhe ao jantar no Palácio.

Na 3ª.feira regressei a Farim onde poucos dias depois pude observar, por duas vezes, a passagem dos helicópteros que transportavam interlocutores que deviam dar continuação aos contactos de Cuntima.

Substituição do General Spínola

Em Agosto entrei de licença. Na metrópole soube da substituição do General Spínola pelo General Bettencourt Rodrigues. Fui à tomada de posse deste último. Ouvi os discursos e pareceu-me que estavam em dissonância com tudo o relatado, o que me surpreendeu. Regressei à Guiné. Já em Bissau pedi audiência ao novo Comandante–Chefe. Abordei o caso e tive a resposta que me surpreendeu: não sabia de nada.

O agente que tinha preparado o encontro em Cuntima, manifestou-me, em Farim, o seu desgosto por se aperceber de que tudo voltara ao princípio. Não entendíamos o porquê da viragem, que era notória.

O responsável pelo 25 de Abril

Um dia, no bar do Estado Maior do Exército, já em 1976, contava o caso a uns camaradas, dado que a manutenção do segredo já não tinha razão de ser. O então Major Monge estava ao meu lado e certamente ouvindo o meu relato… interrompe-me e diz:

- Afinal foi o meu coronel quem provocou o 25 de Abril.

Fiquei atónito. Mas imediatamente me veio à memória que tinha lido dias antes uma informação do Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas (o então General Costa Gomes) para o Governo (do Dr.Marcelo Caetano) segundo o qual para Portugal era preferível na Guiné um desastre militar a uma solução negociada…
Porquê?

António Vaz Antunes (Coronel de Infantaria)
Mafra, Abril de 1987

Esta “Viagem no Tempo” não é ficção. É baseada em factos reais.

É apresentado em forma de “opúsculo”, que me foi oferecido pelo General Vaz Antunes .O resumo jornalístico é da minha responsabilidade.

JERO

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

NINGUÉM FICA PARA TRÁS

Sábado, 4 de Outubro de 2008
NINGUEM FICA PARA TRÁS


“Ninguém fica para trás” foi um título que andou recentemente nas televisões e jornais do País.
O assunto disse muito a muita gente. Os veteranos de guerra que restam são estimados em cerca de 700.000.
«…A Liga dos Combatentes organizou uma missão de resgate dos restos mortais de soldados portugueses que se encontravam sepultados num campo de batalha, na Guiné-Bissau.
A SIC e a revista VISÃO acompanharam, em exclusivo, esta operação sem precedentes, que levou para o mato de Guidage – povoação onde se situava um antigo quartel português – quatro antropólogos, uma arqueóloga, um geofísico, e quatro militares que combateram naquela região, há 35 anos, durante a guerra colonial.
As campas foram descobertas graças a um velho mapa, e ao equipamento do geofísico, que rapidamente detectou sinais no subsolo.
À medida que as escavações avançaram, confirmou-se a presença dos esqueletos daqueles soldados, que a 23 de Maio de 1973 tombaram em combate, de outros cincos militares portugueses e três guineenses».
[1]

Está claro que… “para quem passou por lá” …esta notícia disse muito!
Os 3 paraquedistas que morreram há 35 anos regressaram agora às suas terras natais. Finalmente tiveram eles - as suas famílias - direito a um funeral. Com honras militares e com o preito e homenagem de antigos combatentes.
Nas imagens e notícias que vimos e lemos além dos familiares estiveram também presentes o Secretário de Estado da Defesa, João Mira Gomes, e o Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas , Valença Pinto.
Soube-nos a pouco mas se calhar o “defeito” é nosso! As memórias da Guerra do Ultramar já só “mexem” com alguns….Dizemos nós.
O mapa que o “Correio da Manhã” publicou na sua edição de 27 de Julho último “mexeu” particularmente connosco por diversas razões .


[1] O Início do ataque do PAIGC ao quartel de Guidage, no Norte da Guiné deu-se em 8 de Maio de 1973.
Na operação de auxílio, reabastecimento e contra-ofensiva, que durou de 8 de Maio a 8 de Junho de 1973, as forças portuguesas tiveram 39 mortos e 122 feridos. Pelo menos seis viaturas militares de vários tipos foram destruídas e foram abatidos três aviões (um T6 e dois DO27). Só a unidade de Guidage contabilizou sete mortos e 30 feridos, todos militares. Nos cerca de 20 dias que ficou cercada, Guidage esteve sujeita a 43 ataques com foguetões de 122m/m, artilharia e morteiros. Todos os edifícios do quartel foram danificados. A unidade, que, no conjunto, teve mais mortos foi o Batalhão de Comandos: dez. Sofreu ainda 22 feridos, quase todos graves, e três desaparecidos".





Cumprimos serviço militar durante cerca de 2 anos exactamente na região de Binta e Guidage e por dever de ofício – éramos então o Furriel Miliciano Enfermeiro da C.Caç. 675 – estivemos envolvidos numa trágica tarefa.
A recuperação dos corpos de 7 militares do Pelotão de Morteiros 980, de Farim, que, por acidente durante uma operação ,morreram afogados no Rio Cacheu, a poucos quilómetros do aquartelamento de Binta.
Um dos corpos - ou melhor dizendo o pouco que dele restava depois de uma semana submerso numa zona do rio infestado de crocodilos – foi sepultado a sul de Binta.[2]
Recordamo-nos que junto do corpo, sepultado num improvisado caixão, deixámos (dentro de uma garrafa de vidro) um documento preenchido com alguns elementos de identificação .
A identificação tinha sido então feita por alguns objectos pessoais encontrados nos bolsos das calças do militar.
A ideia – aliás prevista nos regulamentos militares – era a de que, para o caso de um dia mais tarde se proceder à remoção das ossadas ( para se proceder a um funeral condigno) se soubesse a identificação do militar.
Ao que sabemos até hoje ainda não aconteceu.
Todas estas (traumáticas) recordações nos assaltaram depois da notícia da recuperação das ossadas dos 3 paraquedistas de Guidage.

Ninguém fica para trás!?
Infelizmente alguns ficaram.
A recente saga dos paraquedistas de Guidage poderia – e deveria – ser o mote para os representantes do Estado Português tratarem com os governos da CPLP(Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) da transladação condigna dos restos mortais dos militares que “caíram” em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau.
Custará dinheiro? Obviamente.
O nosso Ministério da Defesa não terá disponibilidades para tal!? Sabemos a resposta antecipadamente…Mau grado o interesse …por constrangimentos orçamentais…etc., etc.
Deixamos uma sugestão. Que , neste momento, só nos obriga a nós.
Nos últimos 3 anos os antigos combatentes têm recebido uma pensão anual de cerca de 150 euros (cerca de 40 cêntimos por dia…),[3] pensão essa que deverá vir a ser alterada em futuro próximo conforme recente proposta de Lei do Governo. Vamos portanto –os antigos combatentes – ser “contemplados” com alguns cortes orçamentais. “Coisa” que não será propriamente uma surpresa…
A nossa sugestão é a seguinte. Já que estão com “a mão na massa” acabem com o resto e apliquem os valores disponíveis para pagar uma “divida de honra” que têm com os antigos combatentes .

(2)

Pela consulta do livro «Mortos em Campanha», Tomo II – Guiné-Livro 1 da Resenha Histórico Militar das Campanhas de África (1961-1974), viemos – depois de tantos anos passados -a recordar a sua identificação:
6- João Jota da Costa, soldado nº. 3021/63. Está sepultado no Cemitério a Sul de Binta – Margem esquerda do Rio Cacheu.Observações- Sepultado pela tripulação da LDG «Orion».

(3)
Lisboa, 03 Ago (Lusa) –
A proposta de lei do Governo de alteração dos benefícios atribuídos aos antigos combatentes vai fazer com que nove em cada dez fiquem substancialmente a perder, disse hoje o deputado do CDS/PP João Rebelo.
João Rebelo reagia assim à posição do Governo, expressa pelo secretário de Estado da Defesa, João Mira Gomes, que afirmou hoje que a proposta de lei relativa aos benefícios atribuídos aos antigos combatentes não visa reduzir direitos, mas alargar os beneficiários, acusando Paulo Portas de usar esta matéria para "lutas político-partidárias".
No entanto, João Mira Gomes disse à Lusa que a proposta de lei visa "alargar o universo de beneficiários, introduzir critérios de justiça relativa e criar condições de sustentabilidade financeira para estes benefícios. Qualquer matéria sobre os antigos combatentes deve reunir um largo consenso político e não ser usada para lutas político-partidárias".
Por sua vez, João Rebelo relembrou o Executivo de que "o Doutor Paulo Portas foi o primeiro a dizer que a Lei dos antigos combatentes não devia ser revista por maioria, mas sim por consenso, como questão nacional que é".
Além disso, destacou que "não nos parece adequado", que quase 300 mil antigos combatentes "vão perder cerca de 45 euros ou mais "na pensão que custou a consagrar", enquanto apenas cerca de 30 mil, "os que tiveram menos tempo no Ultramar, consolidem alguns euros nessa pensão".
JS/JPD
Lusa/Fim

Há mais de 30 anos que muitas famílias portuguesas esperam o regresso dos seus soldados, da guerra colonial. O Estado português enviou-os para a frente de combate, mas não resgatou os corpos de quem morreu na guerra.
Providenciem pelo seu regresso.
Para que um dia... possamos dizer...finalmente:
Ninguém ficou para trás.
JERO

NOTAS:
1.ª - O texto em causa é de autoria do nosso associado e futuro dirigente José Eduardo Reis de Oliveira, e encontra-se publicado na PÁG. 9 da EDIÇÃO N.º 2192 - ano LXIII, do Jornal "O ALCOA", de 25-09-2008
2.ª - Segundo nos foi informado, a posição da Liga dos Combatentes, neste processo foi de mera espectadora. Todo o trabalho foi desenvolvido pela associação de Para-quedistas, sendo o Exmo Senhor General Avelar de Sousa a força motriz.
Também, segundo nos foi informado, as exéquias só não decorreram no Mosteiro dos Jerónimos porque a Liga a isso se opôs.


Publicada por Delegação de Alcobaça em 16:24
Etiquetas: noticias

ESMERALDA "BIBI" uma mulher ""rica" à sua maneira...

In memoriam
Esmeralda Coelho Semião,
1924-2008
Foi das pessoas que, ao longo da vida ,mais brincou com “o que não teve”, dentro da melhor tradição da numerosa família dos “Coelhos de boa cepa” – pobretes mas alegretes!
Foi a segunda filha de José Francisco Semião e de Emília Coelho.
Seu pai ,José Francisco Semião ( o Zé Bibi), foi o “bom polícia” que passou toda a sua vida na Guarda Nacional Republicana e que “nunca passou de soldado raso” porque não gostava de castigar ninguém!
Curiosamente a sua “alcunha (Zé Bibi) teve peso nos seus familiares mais próximos e no “ramo” da família.
Ainda hoje, são conhecidos pelos “Bibis”, “petit nom” que está “imortalizado” no quiosque da família frente ao edifício da Câmara Municipal de Alcobaça.
Esmeralda Coelho Semião, nasceu em 4 de Dezembro de 1924 em Alcobaça (na “Rua de Baixo”, como orgulhosamente fazia questão de acentuar) e foi casada com Mário Figueiredo Tavares que no seu tempo foi um excelente jogador de futebol, e que teve o azar de nascer adiantado em relação” ao tempo das vacas gordas” do dito. Foi um grande nº.9 do “Alcobaça” e do “Ginásio”, que teve uma grave lesão num jogo contra o Naval 1º. de Maio, que lhe encurtou a carreira desportiva. Faleceu em 22 de Abril de 1999.
Esmeralda Coelho Semião, que foi casada durante 53 anos, e chegou a bisavó, trabalhou duramente durante toda a sua vida.
Recordava que no seu primeiro emprego – ajudante de alfaiate - ganhava 4 tostões (quarenta centavos) por semana (!!!).
Foi operária da Fiação e Tecidos de Alcobaça durante 42 anos.
Na sua juventude foi componente do Rancho Alcôa. Rivalizava com as mais bonitas, pintando as sua sobrancelhas com paus de fósforo queimado e avivando a cor dos seus lábios com pétalas de flores vermelhas!...
As fotografias do seu tempo confirmam o que dizemos em relação à sua beleza.
Ao longo da sua vida deixou marcas do seu sentido do humor, que eram conhecidas um pouco por todo o lado.
Num Supermercado, de Alcobaça era conhecida por pedir sempre às funcionárias para lhe guardarem o melhor peixe .
«Guarda-me esse goraz que …eu já venho».
Quando regressava comprava …uns carapauzinhos!
Uma das suas “graças” favorita era a da casa do Algarve…
- Então Dª. Esmeralda tem ido ao Algarve? Não, menino, e como não uso a casa está tudo a estragar-se! Vou agora uns dias para mês que vem.
E ria-se…ria –se …como só ela era capaz de fazer.
Foi mãe de quatro filhos; Mário Coelho Figueiredo Tavares, Artur Augusto Coelho Figueiredo Tavares, José Manuel Coelho Figueiredo Tavares e Ricardo José Coelho Figueiredo Tavares, que lhe deram dez netos e seis bisnetos.
Esmeralda Coelho Semião faleceu em 25 de Novembro de 2008, em Alcobaça.
Faltavam-lhe 9 dias para completar 84 anos.
Foi, à sua maneira, uma mulher rica, que deixa muitas saudades a quem a conheceu.
Estamos entre os que a vão recordar com muita saudade.
JERO

MEMÓRIA DE MANUEL BENTO, GUARDA REDES DO GLORIOSO

IN MEMORIAM

Manuel Bento, guarda redes do Benfica e da Selecção Nacional
1948-2007

O País desportivo( e não só) recebeu com surpresa a notícia da morte súbita de Manuel Bento.
Aconteceu ao princípio da tarde de 1 de Março.
Ataque cardíaco fulminante.
Os jornais nacionais e as televisões referiram desenvolvidamente a notícia, fazendo notar que Manuel Bento tinha festejado alegremente na véspera na festa do 103º.aniversário do Benfica.
Clube de que foi guarda-redes, treinador e…lenda viva.
Foi atleta de um clube com milhões de adeptos e ,com as suas exibições, deu alegrias e foi aplaudido por gerações e gerações de benfiquistas.
Vestiu a camisola do SLB por dezoito épocas! Fez 464 jogos oficiais pelo Benfica.Foi 63 vezes internacional , 23 dos quais como capitão de equipa e fez ainda pela Selecção Nacional 28 jogos consecutivos! Uma carreira notável.
Por falar em gerações diferentes recordamo-nos muito bem do seu único jogo oficial em Alcobaça, na época de 1982-1983. O jogo foi em 5 de Dezembro de 1982 com Estádio Municipal de Alcobaça cheio de um público entusiasta.
Surpreendentemente o Benfica perdeu o primeiro ponto desse Campeonato(com Sven Erickson como treinador) no jogo com o Ginásio de Alcobaça.
Nené marcou primeiro pelo Benfica e, depois de dominar todo o jogo e perder a hipótese de fazer mais meia dúzia de golos, os «encarnados» vieram a consentir o empate a poucos minutos do final do tempo regulamentar.
E foi o guarda redes Manuel Bento que no último minuto, com uma extraordinária defesa, evitou a derrota e um escândalo desportivo. O primeiro classificado esteve à beira perder com o último!
Vi o jogo com meu filho então com 12 anos de idade. Éramos ambos adeptos do Benfica desde pequeninos…
No momento da defesa do Bento ficámos momentaneamente divididos.
Nesse minuto eu torcia inteiramente pelo clube da minha terra – o Ginásio de Alcobaça -e gritei de…frustração. Por o Bento ter evitado o golo.
O meu filho aplaudiu e …foi do Benfica do primeiro ao último minuto.
Nunca mais esqueci esse jogo e essa defesa do Bento.
Bento que foi um jogador especial.
Guerreiro, com fama de mau feitio mas que dava sempre tudo quanto tinha - e não tinha - pelo Benfica.«Com agilidade felina, contumácia, praguejou adversários e sossegou companheiros»
Fica para a história como «o homem de borracha». Pequeno de corpo mas enorme de valentia e elasticidade.
Deixa muitas saudades pois é verdadeiramente …inesquecível.
Ele encarnou a fibra e o valor de um jogador…à Benfica
Partiu cedo.
Tinha 58 anos.
Morreu horas depois da festa de aniversário do seu Benfica.
Ficou a memória …e a lenda. Os campeões não morrem.
Adeus Manuel Bento.
Até sempre… Campeão.
JERO

Os Coelhos vão às raizes

ACÁCIO COELHO, O” BOM MALANDRO” DA FAMILIA

ACÁCIO COELHO ,o “Acácio Cerol”, nasceu para ser diferente .
As histórias que os seus familiares mais próximos contam a seu respeito são tantas que a vida dele daria para um livro!...
Foi preso por ser anticlerical, casou à noite para ninguém o ver, como taxista andou anos a fio a fintar as brigadas da PVT e até trouxe um morto no seu carro de praça de Lisboa para Alcobaça, sem os outros ocupantes saberem que o seu “colega de taxi”, que veio sempre calado e,aparentemente, adormecido estava já a fazer a” ultima viagem”.
ACÁCIO COELHO foi um homem irreverente, bem disposto e cordial, que espalhou alegria e viveu a vida numa boa, no estilo de “quem vier depois do último que feche a porta” .
Com um sentido de humor fora do vulgar foi , ao longo da vida, um “autêntico cromo”.
Contam as suas filhas que por volta dos 20 anos de idade foi cantar para a porta da Igreja uma canção revolucionária, que lhe valeu uma noite dormida na cadeia:-
“Não entres na Igreja, oh cavador, É falsa a religião dessa canalha, Os Santos são de pau não têm valor, Dá antes valor a quem trabalha!” Como não podia deixar de ser enquanto esteve preso deu cabo da cabeça ao carcereiro. Então cantava:-
“Liberdade, Liberdade/Quem a tem chama-lhe sua/Eu não tenho liberdade/Nem de pôr um pé na rua”.
Obviamente foi posto na rua!!!
Nunca enriqueceu mas os anos que andou por cá viveu-os intensamente. Nos intervalos da sua profissão de motorista de praça pertenceu ao Corpo dos Bombeiros de Alcobaça e foi músico até à medula.
Foi “fundador”da Banda de Alcobaça, foi componente do Rancho Alcoa(onde consta que deu cabo da paciência ao Ensaiador do Rancho sr.Carlos Campião) e tocou bateria na Orquestra Típica de Alcobaça . Teve os seus próprios conjuntos de música ligeira – “Tropical” e “Bonanza”- que deram brado no seu tempo na animação de inúmeros bailes.
Teve ainda um conjunto privativo que passou à história com o nome de “A Cerolófica”.
Foi membro “honorário” da Banda do Mestre “Arnesto”, cujos componentes abrilhantaram durante anos seguidos a Festa da Senhora dos Enfermos. Abrilhantaram a festa e consumiram largos almudes de vinho tinto da regiâo!!!
E quando foi pai,e mais tarde avô, tentou incutir nos filhos e netos o “bichino da música”. E poucos foram aqueles que não passarem pela Banda, pelo Rancho Alcoa e pela Orquestra Típica de Alcobaça.
Quando à história do morto, que viajou de taxi, de Lisboa para Alcobaça, há diversas versões mas a que eu julgo mais próxima da verdade é a seguinte:- O Acácio Cerol tinha transportado um casal da região de Alcobaça para Lisboa para o homem ,que estava muito doente, ir ao médico. Na tarde da viagem do dia seguinte, em cima da hora combinada, a mulher telefonou a dizer que o marido tinha acabado de morrer, obviamente a lamentar o sucedido e a queixar-se das despesas que teria que fazer para contratar uma agência funerária para trazer o corpo do marido de Lisboa para Alcobaça.
O Acácio Cerol, rápido de raciocínio e com o sentido do negócio à flor da pele, viu que estava em risco de perder dois clientes e propôs à viuva de fresca data transportar o morto, de acordo com as condições combinadas de véspera. Como o morto entrou no taxi ninguém sabe mas parece que viajou encostado à viuva, um pouco mais “calado” que o costume, e os outros ocupantes da viatura nem sonharam o que se estava a passar naquela viagem em tudo parecida com as anteriores no carro “de transportes colectivos” do Cerol.
Não sabemos se foi a partir daquele dia que se começou a chamar “o lugar do morto” a certos espaços das viaturas ligeiras!!! Se foi ...os herdeiros do ACACIO CEROL têm direito a receber “direitos de autor”!
Teve uma vida cheia e fez juz a integrar o nosso Capítulo de “Figuras Marcantes da Família”.
Nasceu em 16.Maio.1920 e, apesar dos maus tratos que deu ao seu próprio corpo, esteve à beira de atingir o “Clube dos 80”.
Faleceu em 7.Fevereiro.1999.
A sua mulher ROSA PIORRO foi uma companheira que soube viver com um homem extrovertido e “danado para a brincadeira”. Nasceu em 4 .Fevereiro.1919, contando actualmente 85 anos.
Depois de viver tantos anos com este “ bom malandro” não será de pensar na sua beatificação?!

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Professor por uma hora e meia!

ALUNOS PROBLEMÁTICOS !?
(Na 1ª.pessoa)
A convite da Professora Margarida Pires fui à Escola Frei Estêvão Martins falar sobre a minha experiência da Guerra do Ultramar.
Aconteceu no passado dia 28 de Abril, de manhã, na Biblioteca da Escola.
Pela minha frente tinha uma hora e meia e a responsabilidade de falar a alunos “ditos” problemáticos.
Seriam uns vinte que preencheram todas as cadeiras reservadas para a “aula” do velhote da guerra.
Ficaram comigo duas senhoras Professoras e uma funcionária da Biblioteca.
O “cenário” ficou completo com a projecção da primeira “página” do “power point” feito no dia anterior até às tantas a madrugada com a ajuda do meu amigo Marco Correia.
Resolvi ficar entre a imagem projectada na parede e os meus “alunos”por uma hora e meia.
De frente para a turma identifiquei facilmente os mais “malandros”. Pelos sorrisos, pela postura descontraída de demasiado à vontade frente a um desconhecido.
Começou a “aula” e disse-lhes desde logo que podiam interromper-me quando quisessem para fazerem as perguntas que entendessem.
Expliquei no início que falava em “2 tempos” da minha vida: como militar com 24 anos e como civil maior de 65 anos!
Aproveitei a oportunidade para os testar sobre os seus conhecimentos de aritmética.
Fiz 4 anos no dia 4, do 04 de 1944!
São capazes de adivinhar a minha idade? Quanto anos tenho?
Ficaram um bocado atrapalhados.
O que mais se aproximou disse que eu tinha 68! Disse-lhe que estava quase certo e avancei na “aula”.
A primeira pergunta foi “malandra”.
Quando falei de uma manada de vacas fui questionado sobre o tipo de “vaca” a que me referia. Percebi facilmente a intenção do jovem e respondi-lhe que as vacas de que falava eram todos de “famílias sérias”…
“Estiquei” a conversa o mais que pude sobre as imagens que iam sendo projectadas tentando não fatigar demasiado a “assembleia”…
Tive alguma dificuldade mas pareceu-me que consegui o interesse dos ouvintes e ninguém adormeceu.
Quando acabei todos bateram palmas o que me sensibilizou bastante.
Mas…faltavam ainda 20 minutos para acabar”a hora e meia”.
Ficámos a conversar. Houver perguntas e mais perguntas. Interessados, simpáticos e sempre agradáveis.
Acabei “o tempo” com uma história de um crocodilo no Rio Cacheu que ficou “gago” com uma partida de uns militares da minha Companhia. Na Guiné. Nos idos de 1964.
Riram com gosto daquela “estória” maluca que, só em parte, aconteceu.
Cá fora, já no recreio da Escola, um deles aproximou-se de mim e agradeceu mais uma vez. Deu-me um abraço. Fiquei comovido.
Miúdos problemáticos aqueles!?
Quem sou eu para contrariar o “diagnóstico”!
Mas sinceramente pareceu-me que a haver problemas eles “moravam”também em gente mais velha…
Vou recordar por muito tempo aquela manhã do dia 28 de Abril!
JERO

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Estórias do quotidiano - Num hospital um berro...

Num hospital um berro…nem sempre tem a ver com sofrimento!

Uma espera de horas num hospital traz-nos, quer se queira quer não, um sensação pouco confortável, algo depressiva.
É um local onde sabemos que mora a dor, a angústia, obviamente associada ao sofrimento que… nos fragiliza um pouco.
Pode-se estar cheio de saúde mas…o meio que nos rodeia faz-nos recordar que um dia poderá chegar a nossa vez…
A história que vos conto aconteceu recentemente e …não tem nada de ficção
Por bons motivos – até se pode dizer elos melhores motivos – estivemos em 22 de Fevereiro último no Hospital de Almada uma boa meia dúzia de horas…
A sala de espera que nos calhou por força das circunstâncias situava-se num «cruzamento» entre o Bloco de Partos com a Unidade de Cuidados Intensivos/ Bloco Operatório. Esta última transmite-nos um respeito especial pois ali se travarão muitas vezes lutas para salvar…vidas!
Aguardávamos o nascimento da segunda neta – a Mariana - e..as horas corriam lentas.
As notícias que nos iam chegando do Bloco de Partos apontavam para um nascimento lá para as tantas da madrugada…
Enganámos a fome à hora de jantar com o recurso a um máquina de sandes e bebidas instalada junto da sala de espera. E…íamos esperando…
Uma (experiente) enfermeira questionada sobre a eventual hora do nascimento deu-nos a entender que… prognósticos só no fim…
Por volta das oito e tal da noite um berro –um autêntico berro - vindo do lado Bloco Operatório fez toda a gente olhar para o longo corredor…sem ninguém à vista .Olhámos uns para uns outros com alguma ansiedade…
Depois de tantas horas já passadas naquele local era a primeira que se ouvia um berro., um grito isolado e…logo depois…silêncio.
Mas tinha sido um «berro» meio esquisito!
Momentos depois ..a tensão momentânea que se tinha estabelecido entre os diversos ocupantes da sala de espera desfez-se e…deu lugar a sorrisos…
Uma mensagem entretanto recebida num telemóvel explicou a razão do estranho berro…
O Benfica tinha marcado o seu segundo golo no jogo de Bucareste!
A espera continuou por mais algumas horas.
A Mariana nasceu no dia seguinte passavam já 21 minutos da meia noite…
Dois.Um. Um número mágico.
Viva…a Vida.

JERO

Estórias do quotidiano - Em tempo de Ano Novo...algumas histórias de Natal!

Em tempo de Ano Novo…algumas histórias de Natal!

«Natal é sempre que um homem quiser».
É, sem dúvida, uma bonita frase, ou melhor ainda, um lindo pensamento.
O pior é que, na vida real o querer do homem, nem sempre chega para …chegar ao Natal.
As quatro pequenas histórias que se seguem não são ficção e aconteceram recentemente.
1. O rapaz do helicóptero
Já veio publicado em todos os jornais locais.
Um helicóptero esteve algumas horas pousado no relvado do Estádio Municipal de Alcobaça para transportar um jovem que, devido a uma queda, sofrera um grave traumatismo craniano. A invulgar aterragem de um helicóptero no relvado motivou a deslocação de algumas dezenas mirones ao local. Também lá estivemos (como jornalista) e, durante cerca de uma hora e meia, ouvimos muitos e bons palpites sobre o assunto, autênticas pérolas da sabedoria popular!

Criticavam-se – por exagerados -os meios que estavam a ser utilizados na evacuação de um jovem rotulado de drogado, que tinha caído do 1º. andar na Villa Ramadas., uma instituição dos arredores de Alcobaça que recupera toxicodependentes. E os mirones iam olhando para o relógio a cada momento pois o rapaz nunca mais vinha e o espectáculo estava a arrastar-se , com prejuízo da hora do almoço .Um dos populares distinguia-se entre os demais nas críticas, repetindo vezes sem conta que era por estas e por outras que…«toda a vida havia de ser revolucionário». E acrescentava para quem o queria ouvir que era mais um drogado que ia ocupar uma cama de um hospital e gastar dinheiro ao Estado. Nem uma voz se erguia para lembrar que se estava a falar de um ser humano, eventualmente com família que estaria aquela hora a sofrer angustiada pela vida um jovem de apenas 24 anos. Quando (finalmente) o rapaz chegou na ambulância dos Bombeiros e foi transportado de maca para o helicóptero continuava-se a falar do assunto como estivesse em causa um «boneco insuflado».
O espírito de Natal não andava obviamente por ali perto.
Por perto …só «o direito à indignação» do...revolucionário para toda a vida.
3-O jovem do CEERIA que não se alimenta
3-O velho «Mister» que vive só
4-Visita ao passado no… Monumento dos Combatentes
Cheguei ao Monumento mesmo em cima do render da guarda. À voz de «destroçar» os jovens militares correram rapidamente para a carrinha da Armada que os esperava …para o fim de semana.

Dois deles responderam simpaticamente ao meu cumprimento com uma regulamentar continência. Soube-me bem o cumprimento militar a que já há tantos anos estava desabituado. Embora estivesse mais gente no local fiquei com a sensação (agradável) que tinham reconhecido em mim um antigo combatente.
Em 21 de Dezembro, aquela hora e com o frio da noite que se aproximava, cirandavam ainda por ali meia dúzia de pessoas– quase todos jovens – fotografando e fazendo-se fotografar junto do altaneiro pórtico central, que é a parte mais emblemática do majestoso conjunto. Só eu me dirigi ao comprido muro, com dezenas metros de comprimento, onde estão inscritos os nomes dos militares que morreram ao serviço de Portugal.
Encontrei sem dificuldade o nome do meu melhor amigo dos tempos do serviço militar da Guiné: Álvaro Vilhena Mesquita, Furriel, morto em 1964. Os nomes estão ordenados em função do ano dos óbitos e por ordem alfabética.

Estive por ali uns minutos…recordando-o. O Álvaro era a antítese do militar «durão». Não tinha mesmo nascido para aquilo …Era (fisicamente) frágil e pegava na arma ,cada vez a que isso era obrigado, desajeitadamente. Estava com baixa na altura da (sua)última patrulha e para vir de férias à Metrópole daí a dois dias…Nos últimos tempos andava nervoso e a aguentar com alguma dificuldade as piadas dos colegas que achavam que ele estava «a fazer render» a sua doença …«para não ir para o mato».
É que faltava tão pouco tempo para ir até Farim apanhar o avião para Bissau e depois vir até ao Continente para passar o Natal com a Família!
O seu Alferes «pediu-lhe» para ir com as viaturas buscar os pelotões que tinham saído em patrulha por volta da meia noite. A deslocação das viaturas era por volta do meio dia e para um local a 10 kms do quartel .O local …não tinha perigo». O Álvaro foi e a mina que o seu Unimog pisou estava implantada nessa zona «onde não havia perigo». Todos os ocupantes da viatura foram violentamente projectados após a explosão. Só Álvaro morreu. Instantaneamente.
A moral da Companhia ficou …destroçada. O Capitão, no dia seguinte, pôs 3 pelotões no mato. E a dose repetiu-se mais alguns dias . Nem tivemos tempo( nem forças) para chorar o Álvaro. Aliás, a ideia do Comandante de Companhia era essa: a guerra não tem intervalos e…nem se pode pedir «um minuto» como no basquetebol!
Fui eu que escrevi à família e juntei as suas coisas pessoais para enviar ao Pai, ao tempo director do Jornal de Famalicão(próximo do Porto).
Quando em Maio de 1966 regressei da Guiné uma das primeiras viagens que fiz foi a Famalicão. Fui conhecer a família do Álvaro e…visitar a sua campa. Não tive coragem de contar à Família o que hoje aqui relato.
Nesse longínquo ano de 1964 faltavam 4 dias para o Natal quando o Álvaro foi na patrulha que…«não tinha perigo»!

Estas minhas histórias … não têm fins felizes. Longe disso. Aconteceram no mês de Natal.
Em três das histórias (talvez) ainda seja possível melhorar alguma coisa. Bom seria que, em futuro próximo, os escolhidos das minhas histórias sentissem que o Natal(o espírito de Natal) andasse por perto…deles.
Resta o protagonista a minha quarta história.
O meu amigo da Guiné com o nome inscrito no comprido muro do Monumento dos Combatentes.
Que …desde 1964…não teve direito a mais Natais.
A família mais próxima, principalmente a sua Mãe(que conheci inconsolável com a perda do seu Filho) não terá tido desde então mais nenhum Natal feliz.
O Álvaro (de Vila Nova de Famalicão) é recordado por todos que o conheceram como um jovem bom que …não gostava da guerra.
A lembrança que deixou é de …Paz.
E, curiosamente, esteja onde estiver a recordação que deixou aos que com ele mais de perto conviveram é que …com pessoas como ele era o… Natal poderia ser sempre quando um homem quisesse.
Senti essa paz, esse espírito de Natal …quando estive perto dele…no Monumento dos Combatentes.
A ele, à sua memória, devo um dos melhores momentos do Natal de 2006.

JERO

Quarenta e tal anos depois ...o Alferes Médico Martins Barata na vida civil

Quarenta e tal anos depois... os setenta!
O nosso Alferes Médico na vida civil...

O tempo passa e... há poucos meses atrás (em 12 de Abril de 2008) estive na festa de aniversário dos 70 anos do meu Médico.
Setenta anos!!!

N’outros tempos... 70 anos eram uma idade complicada, associada à ideia de um velhinho caquéctico, trôpego, que já não diz coisa com coisa.
Nada mais errado quando o septuagenário em causa é o Dr.Alfredo Roque Gameiro Martins Barata.
Tirando algumas rugas, os cabelos grisalhos e umas gramas a mais continua na mesma: corpo de “alferes”, mexendo-se com desembaraço, tranquilo, afável e bem disposto.
Na família tem a fama de... distraído.
Na vida militar essa”fama” não colheu e se algumas dificuldades teve... terá tido mais a ver com o facto de ser uma pessoa muito bem-educada.
E, como se sabe, na vida militar encontra-se filhos de...muitas mães com quem, muitas vezes, não resulta, um tratamento do tipo “português suave”! Mas... adiante.
Como não podia deixar de ser na festa dos seus 70 anos recordámos a viagem acidentada do Rio Cacheu dos anos 65!
«Ah sim, lembro-me. Foi do género da estória "da ida à guerra do Raul Solnado”».
Os filhos a seu lado olhavam-no espantados pois não conheciam essa aventura de seu Pai.
Dei-lhes a ler a “estória” do Diário da C.Caç. 675.
De espantados passaram a... pasmados.
Além de excelente Médico foi, mais tarde, “Anjo da Guarda”de muita gente – desde os tempos da Guiné até aos dias de hoje ajudou inúmeros ex-militares da sua Companhia – .
Sempre compreensivo e de extrema bondade, “apagando” propositadamente a sua importância nas ajudas que concedeu a quem o procurou.
Os “suplementos” biográficos que se seguem são da responsabilidade do seu irmão mais velho, José Pedro.
«História do meu irmão mais novo, contada pelo irmão mais velho…
Ao irmão mais novo, sentado nos degraus do pátio, contava eu histórias inventadas ali.
Já nessa altura era muito distraído e perdia coisas. Gostava de guardar as caixinhas e os “jornalinhos” dos remédios, o que já apontava para uma vocação diversa da familiar,virada para os bonecos e as pinturas. Não viria a arrepender-se!
Já crescidote, observava com muita atenção uma menina loura que descia a Rua ao vir da Missa, acompanhada pelo irmão(dela, claro).
Mais tarde, distraído, mas esperto, tratou de casar com a menina loura.
Foi depois para a escola dos médicos, como era de esperar...
E saiu enfim Médico, o que significa que foi logo direitinho para África, pois!..
Iniciou a sua carreira hospitalar em África, assegurando o funcionamento do Hospital de Binta.»

Nesta parte poderemos dar uma “ajuda” porque estivemos por perto...
Além dos militares que frequentavam o “Posto de Socorros (no “Largo da Tomada da Pastilha”), havia também grande número de nativos, que apresentavam o mais variado tipo de enfermidades.
Tivemos casos de lepra (uma doença que era suposto já estar então erradicada...), elefantíase e um terrível surto de sarampo, que causou a morte a mais de seis dezenas de crianças da tabanca de Binta.
No que respeita aos nossos militares havia uma doença muito comum antes das idas para “o mato”, com sintomas muito habituais tanto ao nível de praças, como sargentos e oficiais...
Vómitos, diarreias e repentinas dores de cabeça que tinham muito a ver com uma coisa chamada "cagaço", medo e/ou receio.
Com o tempo aperfeiçoámos uma “mezinha” que atenuava a “doença”: o comprimido nº. 8 do L.M.(aspirina), fornecido em diferentes embalagens, conforme a graduação do “paciente”, que ia resolvendo quase todos os problemas.
Tivemos também momentos bem dramáticos aquando da morte dos nossos militares.
Lembro-me particularmente de ter chorado abraçado ao meu Alferes Médico a morte do soldado Nascimento, quando soubemos no dia seguinte “via rádio”, que já tinha chegado
cadáver ao Hospital de Bissau.
No que respeita a Binta não chegámos a ter um Hospital mas quase...

Uma das histórias clínicas mais espantosa passou-se com uma nativa que um dia se apresentou à consulta queixando-se de ter engolido uma cobra enquanto dormia!
O Dr. Barata já falava umas coisas dos dialectos locais e rapidamente percebeu que a sua doente devia padecer de lombrigas que, durante o sono, lhe teriam chegado à boca(?!).
Pensou num vomitório e na apresentação de um pequeno réptil à doente após a medicação, “cena” que ficou marcada para o dia seguinte.
Entretanto encomendou-se a captura de uma pequena cobra, o que não foi difícil de conseguir.
Tudo preparado chega-se ao dia seguinte e, conforme o plano estabelecido, é administrado à paciente o vomitório, tendo por perto a pequena cobra(já morta) para no “pós–vómito”convencer a nativa que... estava curada.
O pior foi mesmo o que se seguiu.
O vomitório, durante alguns longos minutos, provocou vómitos sim mas a todo o pessoal do Serviço de Saúde menos à doente que...nunca mais vomitava.
Finalmente lá aconteceu e a cena da cobra resultou inteiramente.
Também um parto feito na tabanca, com a parturiente de joelhos, virada para Meca teve alguns contornos de surrealismo...
Na semi-obscuridade da morança (cabana), onde corriam galinhas e cabras, estavam vários familiares expectantes e uma velha parteira-feiticeira, que veio a cortar com um facalhão de “cozinha” o cordão umbilical...
Ainda me lembro do extraordinário sentido de humor do Dr.Barata referindo-se à sua “colega” parteira quando perguntou pelo bisturi para cortar o cordão umbilical!
Voltando aos “suplementos” biográficos do seu irmão mais velho, José Pedro.
Ainda em Binta... «Imagino que, absorto nas suas responsabilidades, distraído como é, não se tenha apercebido bem de certos inconvenientes e certos incómodos do momento, a ponto de ter convidado a senhora loura a passar umas férias, alojando-se no luxuoso Resort & SPA “The Derelict Madeiro’s House”, ( de estilo colonial) – aproveitando a época baixa do turismo da Guiné, na região do Cacheu.

A senhora branca e loura causou grande sensação em Binta, tornando-se mesmo uma
atracção turística.»
Mais uma achega da nossa parte:
A chegada a Binta de Manuela Martins Barata foi, além de uma “atracção turística”, uma prova de afecto e coragem que não está ao alcance de qualquer pessoa. Esteve ao alcance de uma jovem Senhora, que deixou Lisboa para ir ter com ao seu marido aos confins do mundo!!!
Além do desconforto das instalações do “Resort” é preciso uma coragem que, na altura, nos espantou a todos. E que teve efeitos benéficos na vida da Companhia que rapidamente se habituou à senhora branca e loura que nos trouxe de novo a possibilidade de ter, por perto, uma “procuradora” das nossas mães e noivas que tínhamos deixado na Metrópole.

E a senhora branca e loura esteve em Binta sete meses, o que é uma proeza extraordinária.
Voltando aos “dados” do irmão mais velho, José Pedro.
«...Mas ele não se distraiu, não se esquecendo de a trazer de volta... (da Guiné) ...e providenciou depois para me dar dois magníficos sobrinhos (Passei a ter oito! Nada mau!...)



Começou a entrar depois na Sociedade Internacional de Gentes de Artes e Saberes fora do alcance comum que se encontra em reuniões obscuras e limitadas a iniciados (Simpósios, Congressos e coisas dessas, para disfarçar...); gente dedicada a práticas esotéricas e misteriosas, reservadas e ocultas.

É uma gente que se reúne frequentemente em cavernas fechadas, longe das vistas do comum onde, sob luzes cruas e intensas e trocando em voz baixa palavras crípticas, todas de ara tapada e vestindo burkas verdes, se dedica a rituais secretos ominosos.
Pelo menos é o que parece, aos não iniciados, que não em acessos àquelas celebrações inquietantes! (“Al-Quaeda”? Seitas tenebrosas?).
O meu irmão diz que não: que é apenas “cirurgia”, e como ele é seriozinho eu, enfim, acredito...
Entretanto, nos intervalos dedica-se a ouvir música ou a visitar países distantes nos 5 continentes, paraísos exóticos e longínquos, e até indo mesmo ao Algarve.
Com isto tudo, agora que ele faz 70 anos, acho que chegou a altura de ser ele a contar histórias ao irmão mais velho!
Nota – Este documento deverá ser actualizado logo que ele fizer 80 anos.»

José Pedro Roque Gameiro Martins Barata
(autor dos desenhos)

Subscrevemos e... morra quem se negue!

JERO

domingo, 23 de agosto de 2009

Uma viagem acidentada vivida e contada pelo Médico da "675"

O Médico
Uma viagem acidentada vivida e contada pelo Médico da «675»
Alfredo Martins Barata

«Esta é a história da «minha guerra»

«Tiros no Cacheu»
Houvera um desembarque de fuzileiros em Tambato Mandinga, no Oio, numa tabanca que um observador atento que suba o Cacheu até Farim descobre, a custo, entre árvores de grande porte que se erguem na margem Sul do rio.
A operação fora bem sucedida.
– Agora os tipos devem estar irritados. Já não torno a ir a Farim de bote de borracha; só de submarino – disse eu um dia depois ao jantar. Todos riram. Alguém depois falou:
– Dos presentes só o Doutor é que desconhece o que é uma emboscada.
– Sim, respondi e não tenho nenhum prazer em conhecer.
O problema em princípio não se podia encarar seriamente.

Estávamos em Binta havia 7 meses, nenhum barco tinha ainda sido atacado e, para ir à Metrópole como seria o meu caso dentro de pouco tempo, qualquer um de nós seria capaz de se meter a caminho nem que fosse a nado.
Porque apesar de todos os melhoramentos que tornam a vida menos dura em Binta, Binta é Binta e Lisboa é Lisboa.
Ora a primeira meta da viagem era precisamente Farim e foi fardado de «ronco» amarelo, de galões dourados e tudo, com máquina fotográfica na mão direita e o saco de bagagem na esquerda que embarquei, despreocupadamente, (e porque não?) certa manhã de Fevereiro numa ronceira L.D.M. rumo àquela vila.
Não ia só. Comigo ia uma pequena multidão colorida e palradora: eram mulheres indígenas cuidadosamente sentadas no chão, com as saias bem enroladas entre as pernas, tendo a seu lado um estendal de tachos e meias-cabaças cheias de tomates e arroz, era um cabrito barulhento e saltitante, eram pretos acocorados fumando cachimbo ou mastigando cola, eram alguns companheiros de Binta (entre os quais o nosso primeiro Santos) que na proa conversavam.
Toda esta feira flutuante dava uma nota colorida e alegre àquela austeridade cinzenta-bélica tão característica dos navios de guerra. Abandonada a um canto, uma metralhadora
apontava para o ar e chamava-nos à verdade: estávamos em guerra. Uns tiros isolados podiam atingir toda esta gente amontoada...
Mas, logo a seguir, a nossa atenção saltava para a vida, para o Sol e para a natureza que nos envolvia.
Chegámos finalmente a Farim, onde, depois de umas horas de espera inútil soubemos que o voo do Dakota tinha sido adiado para o dia seguinte. Paciência só no dia imediato
chegaria a Bissau.
Para não ter de dormir numa cama estranha, num ambiente estranho, numa terra estranha, aproveitando o transporte da L.D.M. resolvi deixar a bagagem e voltar rio abaixo
até Binta.
A viagem de regresso com os mesmos companheiros foi mais calma. Entardecia. A lancha empurrava as águas paradas, levantando com o seu barulho bandos de pássaros e macacos que na margem, escolhiam poiso para a noite.
No dia seguinte de madrugada, embarquei novamente a caminho de Farim, Bissau e Metrópole, desta vez só, sem o bulício da véspera.
O dia começava a amanhecer, cinzento e húmido; mais tarde viria o sol brilhante e quente. Agora pairava uma neblina ténue junto ao tarrafo que escondia os ramos mais altos e que pouco a pouco se ia desvanecendo com o romper da claridade.
No interior do barco a tripulação tomava a seu café. Em cima, o piloto olhava atento o rio pela vigia largamente aberta na cabine blindada, cortando curvas para abreviar caminho.
Encostado à torre da peça desguarnecida, passava os olhos pelas margens do rio sempre belo, pensando comigo mesmo:
– Aqui é a foz do Caur, mais adiante Tambato Mandinga...

Mas há aqui uma aberta nas árvores das margens... Se não me engano... Que deixa ver as moranças da tabanca... Sim, é ali.
(Já lá tínhamos chegado e com efeito era ali).
De repente, ali mesmo, um clarão reluz, e outro e mais outro.
Antes que me pudesse aperceber do sucedido, caí, não sei se obedecendo ao instintivo «deitar» das instruções de combate, se por ter sentido uma pancada quente e indolor no
flanco esquerdo que me puxava para o chão.
As ideias de baço, de hemorragia, de esplenectomia que passaram no espírito, desapareceram rapidamente logo que verifiquei que tudo não passava de um ferimento muscular parietal.
Entretanto a lancha virara de bordo, a fim de conseguir melhor posição de tiro.
O artilheiro subiu ao seu posto de combate e com umas rajadas potentes de calibre 20 mm «calou» o tiroteio inimigo.
Aproveitei para acenar para o local onde deveriam estaros terroristas para que eles, quando fizessem o relatório da «operação», não dissessem que tinham abatido um alferes da tropa de Binta...
A lancha voltou ao seu primitivo rumo e continuou Cacheu acima, a caminho de Farim.
Fez-se o balanço da situação; quando souberam que tinha sido atingido de raspão os homens da lancha excederam-se em cuidados pondo ao dispor o material de enfermagem de bordo e oferecendo café quente que aceitei com agrado. Estava em jejum e à minha volta percebia um estranho cheiro a carne assada que depois vi que provinha das feridas.
Discutia-se o ataque; uns diziam que tínhamos sido atingidos com uma bazucada, outros, como eu, sustentavam que os rebentamentos ouvidos não passavam de granadas de mão
lançadas da margem para «ronco».
Os malandros tinham visto um oficial a 80 metros, de pé, isolado na coberta da lancha, feito «pato» com as mãos nos quadris e esperaram que o alvo ficasse no enfiamento de tiro para abrir fogo.
Pouco depois desembarquei em Farim. O «Dakota» já tinha chegado e, quando a correr alcancei o Comando, já o avião se preparava para deslocar.
Ainda não era dessa vez que ia para Bissau.
Teria que esperar mais um dia, talvez dois, e, à noite dormi numa cama estranha, num ambiente estranho e numa terra estranha.


Alferes Mil. Médico Martins Barata “visto” pelo seu irmão Arqtº.José Pedro Roque Gameiro Martins Barata.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

BANCO DO AFECTO CONTRA A SOLIDÃO-PARTE II

AINDA A MEMÓRIA DO CORONEL FERNANDO CAVALEIROMensagem encaminhada de jotajero@sapo.pt -----
Data: Thu, 16 Jul 2009 00:52:16 +0100
De: jotajero@sapo.pt
Assunto: Re: CCaç 675
Para: Virgínio Briote
Citando Virgínio Briote :
Caro José Eduardo

Chamo-me V. Briote e pertenci à CCav 489, BCav 490, que esteve destacada em Cuntima até Julho de 1965. Ouvi falar muito da CCaç 675, e ainda hoje a minha memória guarda relatos do vosso comportamento militar e cívico em Binta. Não cheguei a conhecer pessoalmente o vosso cmdt, o então cap Tomé Pinto, mas ainda hoje recordo o meu cmdt de Batalhão, o então ten cor F. Cavaleiro, que não se cansava de falar da CCaç 675 como um exemplo a seguir. Repito, não só pelo vosso comportamento operacional, como também pelo trabalho que desenvolveram a favor de toda aquela população. Por isso é com grande interesse que espero que me envies á cobrança o livro para
Av Estados Unidos América, 3, r/c, Esqº, 1700-163, Lisboa.

Espero vir a conhecer-te pessoalmente.
Um abraço
vbriote

No caso de preferires usar outro meio que não seja a cobrança os meus nºs : 218 461 674 ou 917 520 066

Caro Virgínio Briote
Fiquei muito emocionado com as tuas notícias. As gentes do Bat.Cav. 490 dizem-me muito. E a recordação do Ten.cor. Fernando Cavaleiro é-me muito cara. Vou-te enviar amanhã o meu livro e vou fazer todo o possível para em breve te conhecer pessoalmente pois temos muitas memórias em comum para recordar.
Um grande abraço e até breve, assim o espero.
J.Eduardo Oliveira

Caro Virgínio
Bom dia
Lembrei-me ontem de uma história no mínimo invulgar que me aconteceu na vida civil com o já então CORONEL FERNANDO CAVALEIRO.Passou-se no Verão de 1975 ou 1976. Estava na praia de S.Martinho do Porto equipado para tomar banho.Corria de calções junto ao mar quando vejo ao longe uma figura que me pareceu familiar. O porte altivo e uma postura desenvolta lembravam-me o meu Comandante de Batalhão dos tempos da Guiné. Aproximei-me e era mesmo ele.De roupão de banho, descalço e com a toalha na mão ali estava o Cor. Cavaleiro. Institivamente pus-me em sentido e apresentei-me.O meu Coronel dá-me licença? Tive a honra de servir sob as suas ordens no Bat. 490. Estacou e ainda antes de me apertar a mão perguntou-me. A que companhia pertencias? À C.Caç. 675. Ah já sei. A do Tomé Pinto. Foi um grande oficial e teve uma Companhia das melhores.
PUS-ME À VONTADE E TIVE DIREITO AO SEU APERTO DE MÃO. Caminhámos juntos algumas dezenas de metros. Soube que tinha estado preso em Caxias durante 10 meses. Sem culpa formada e sem qualquer interrogatório. Disse-o sem queixumes. Altivo e "teso" como o sempre tinha conhecido.
Regressei lentamente para junto da minha família. Contei-lhes o que se tinha passado. Tinha estado em "sentido" em calções de banho!
Tinha cumprido um ritual da vida militar...à civil. Um ritual de que me orgulho e que recordo com saudade.Os valores do respeito e da dignidade.
Devo-te a ti esta boa recordação. Do Grande 490 e seu mítico Comandante.
Um abraço de até breve.Assim o espero.
José Eduardo Oliveira








O ritual


----- Finalizar mensagem encaminhada -----

BANCO DE AFECTO CONTRA A SOLIDÃO

CORONEL FERNANDO CAVALEIRO -BCAV 490
Quinta-feira, 4 de Dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3562: Banco do Afecto contra a Solidão (1): A última comissão do Coronel (Jorge Cabral)
1. Mensagem do Jorge Cabral:


Hoje mando uma estória diferente.Nem triste nem alegre. Real sim.

Convém lembrar que nem só do pão vive o Homem. Apetece-me fundar o Banco do Afecto contra a Solidão.

Jorge Cabral



2. Um Abraço para o Coronel na sua última Comissão
por Jorge Cabral

O Coronel já passou os oitenta. Tremem-lhe muito as mãos e às vezes parece ausente. Visito-o, mas confunde-me. Refere Nampula e a mulher do Capitão... Que mulher! Nunca fui a Nampula... mas concordo.

Aqui no Lar é bem tratado. Médico, enfermeira, dietista, hidromassagem, animação, cinema... Tem tudo, quase tudo...

Pelo Natal, recebe muitas prendas, roupões, pijamas, pantufas, luvas... deixam na portaria ou mandam pelo correio.

Os filhos, os netos, os amigos, não o visitam. E convidá-lo nem pensar... Baba-se, entorna a sopa, não diz coisa com coisa...

Fala-me de África e das suas quatro Comissões. À despedida, troca-me o nome.
Desejo-lhe Felicidades. E sei, estou certo, que entendeu, o Grande Abraço que lhe dei.

CORONEL FERNANDO CAVALEIRO
Jorge Cabral

__________

Notas de vb:

1. Este belo texto do Jorge, na sua singeleza, fez-me recordar a visita que fiz este ano ao outrora famoso atleta olímpico, Cor Cavaleiro. Um homem grande, robusto, que, em 1965, em Farim, quase nos 50, fazia o pino na piscina antes de se mandar para a água e, que no intervalo das marchas que forçava para Canjambari, marchava para Bissau, para a Associação Comercial esfolar uns patos ao bridge. Ele, que era um Mestre, repousa agora, num Lar em Oeiras... Na altura em que o visitei escrevi para mim:

Num dia de Março de 2008 localizei-o num lar das Forças Armadas, em Oeiras. Vivo, o Coronel Cavaleiro? Ó meu amigo, o Senhor Coronel está aqui para as curvas, respondeu-lhe do outro lado do fio, o bem disposto telefonista. Quer falar com ele? Aguente aí um pouco. Sou um ex-alferes do BCav 490, estive em Cuntima. Uma voz de senhora do outro lado, o meu marido deve estar no 1º piso, sentado a ler um livro numa mesa com as cartas, à espera que apareçam parceiros para o bridge. É sempre assim, no fim do almoço.

E no dia seguinte em Oeiras, no IASFA (Instituto Acção Social das Forças Armadas), ainda não eram 14 horas, lá estávamos nós, o Miranda e o Raimundo do Como (os dois da Op Tridente) e eu às voltas, a subirmos e descermos escadas, o senhor Coronel esteve agora aqui, procurem-no no 1º piso.

Uma sala, numa mesa ao fundo, de costas para a janela (talvez para melhor ver as cartas e as caras dos parceiros), um senhor baixo, aspecto franzino, é ele. Nada que se parecesse com o Ten Coronel que eu conhecera em 1965. Mas era mesmo ele, o Coronel F. Cavaleiro, mais baixo uns bons centímetros e mais leve do que naqueles tempos. Sorriso gentil nuns olhos marcados de manchas, ar débil, o Coronel de pé à frente de jovens de 60 e poucos.

Sou o Miranda, meu Coronel, o Como, Farim, Comandos. Eu sou o Raimundo, o tipo do foto-cine do Como, as imagens que o Joaquim Furtado passou na Televisão fui eu que as fiz. Briote, meu Coronel, trabalhei poucos meses consigo, estive em Cuntima, na CCav 489 do Cap Pato Anselmo.

Pois, vocês têm que falar mais alto, o dedo apontado para o ouvido direito. A Guiné, bom, a Guiné foi uma doença que se entranhou em nós, Cor Cavaleiro. Quarenta e tal anos depois voltámo-nos a descobrir uns aos outros, almoçamos uma vez por mês, falamos da vida que levámos naquelas terras.

O Coronel, que naqueles anos media para aí um metro e oitenta e pesava seguramente mais de oitenta quilos, à frente de nós era o mais pequeno e mais magro. Estou com 60e poucos quilos, eu que pesava 80 e tal, também estou com 91 anos, é altura de ter um pouco de cuidado. Leio, jogo bridge, ando um pouco a pé, olhem, ando aqui a ver os dias escorrer. Netos? Oito filhos, netos, bisnetos, não me perguntem quantos. Sim, vi na TV a Guerra do Furtado, só não entendi porque é que não transcreveu integralmente a carta, aliás muito pequena, que nós apanhámos a um mensageiro, aquela em que o Nino dizia que já não tinha nem gente nem população para aguentar a guerra no Como...

2. Vd. último poste do Jorge Cabral em:

26 de Novembro de 2008 >Guiné 63/74 - P3519: Estórias cabralianas (42): As noites do Alfero em Missirá e uma estranhíssima ementa (Jorge Cabral)
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VIRGINIO BREOTE

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

M4 - Retalhos da vida de um jornalista - "O ALCOA"

IN MEMORIAM
OLEGÁRIO JOSÉ DO NASCIMENTO
1933-2009


Quando nos encontrávamos nas ruas da nossa Alcobaça …“Fadistas chorai, chorai” era a minha saudação brincalhona para o meu amigo “Galhito”, diminutivo porque era tratado pelos familiares e “aliados” mais íntimos(“Galhito” corruptela de Olegário, que passou por Olegarito e acabou em “Galhito”…).
Esta minha saudação “provocatória” tinha, obviamente, a ver com a veia fadista do Olegário do Nascimento que, em “estado novo” e mesmo mais velho cantou o fado como poucos. Na sua terra e …não só!
Estivemos com ele junto ao Centro Comercial da Gafa dois dias antes do trágico acidente que o vitimou.
Quando soubemos da triste notícia - pelo telefonema de um amigo - que o Olegário tinha morrido ficámos alguns momentos sem palavras.
Mas foi mesmo o “Galhito” !?
Tinha sido efectivamente o “Galhito” num acidente de viação próximo de Mendalvo, a pouca distância de Valbom, local onde vivia nos últimos tempos .
Recordámos de imediato a nossa última conversa e como o tínhamos gabado pelo seu excelente aspecto.
- Eh pá, estás bestial. Vais entrar no Campeonato dos “oitenta” em grande forma!
Ele riu-se, no seu jeito habitual e queixou-se um bocado da “máquina”. Terminámos a nossa breve conversa com uns comentários um bocado cáusticos em relação à política local e seus candidatos.
Foi a nossa última conversa e o nosso último encontro numa “esquina da vida”!
Quem é que iria adivinhar que era a último?
Na manhã do dia do seu funeral recordámos com amigos comuns algumas “notas” da vida do Olegário.
Os bons velhos tempos de solista da Orquestra Típica de Alcobaça(juntamente com o seu irmão Valdemar, na regência do Maestro António Gavino) e ,depois, a sua fase “ fadista”, que lhe proporcionou muitos êxitos pessoais mas ,segundo pensamos, reduzidas compensações materiais!
Faltou-lhe então um “golpe de asa” e uma mão amiga para lhe abrir as”portas certas” do mundo do fado.
Como seu modo desprendido e pouco “interesseiro” que o caracterizava o “Galhito” também não lutou o que devia ( nem, com certeza; bajulou os “donos” do meio fadista) e terá passado ao lado de uma grande carreira artística.
Depois imigrou uns longos anos para a Alemanha, onde trabalhou duramente e…não fez fortuna.
Quando regressou “às origens” montou ,com a sua mulher, um pequeno negócio de pastelaria caseira.
Recordam os seus vizinhos , que estiveram em peso no seu funeral, que o “Galhito” tinha uma grande paixão por animais. Tinha no seu quintal da sua casa da Rua “Nova” (Rua Cândido dos Reis, em Alcobaça) cães, pombos e outras espécies de passarada, que tratava desveladamente.
Podia faltar dinheiro para tudo mas nada faltava para os seus animais de estimação.
No que respeita ao seu feitio tinha uma maneira muito especial de ser.Era frontal e crítico sem medo das palavras, o que, obviamente, não agradava a toda a gente.
Não as mandava dizer por ninguém …
Era um homem integro, amigo do seu amigo, que não nasceu para ser rico. Contentava-se com pouco e…vivia à sua maneira.
Quando ficou viúvo, depois de prolongada doença de sua mulher, foi-se bastante abaixo. Forte de carácter aguentou-se no “mau bocado” e viveu as suas dificuldades sem lamúrias. Não era mesmo homem de se queixar.
Manteve o seu pequeno negócio de bolos caseiros e ,por vezes, respondia a convites para algumas fadistices. E quando actuava era normalmente o “maior”. Nascera para cantar o fado!
Alguns anos depois casou de novo, tendo o cuidado de avisar toda a família da sua primeira mulher, que aprovou e incentivou a sua nova relação, nunca deixando de o tratar com amizade e carinho que, aliás, o “Galhito” bem merecia.
Acabou os seus dias ,de maneira inesperada e brutal, vítima de um acidente de viação de que não teve a mínima culpa.
No dia 15 de Agosto de 2009 estivemos no cemitério de Alcobaça. Na sua despedida estiveram muitos amigos e familiares.
O seu caixão teria merecido ,em nossa opinião, ter sido coberto pela bandeira da Orquestra Típica de Alcobaça.
Mas se bem conhecemos o Olegário José do Nascimento esse eventual esquecimento não o deve ter importado muito…
Fadistas chorai, chorai.
Adeus “Galhito”.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

M3 - O arriar da última bandeira nacional na GUINÉ, com cerimónia oficial em 9 de Setembro de 1974

Foi o meu Camarada-de-Armas Magalhães Ribeiro quem arriou a última bandeira nacional na Guiné, com cerimónias oficiais, encerrando assim, definitivamente, o domínio ultramarimo português e a guerra que ali travávamos naquela terra africana.

Guiné > Mansoa > 9 de Setembro de 1974


Mansoa, a última Bandeira

Com o emblema de Ranger no peito
O destino seguinte foi Évora
Foi um período de descanso, depois,
Daquela especialidade dura.

Corria o ano de setenta e quatro,
O primeiro dia de Fevereiro,
Quando saíram as mobilizações
P’rá Guiné, um Batalhão inteiro.

Depois dos serviços ali prestados
E, pr’ó Vietname mobilizado,
Tarecos às costas mais uma vez
E fui conhecer Tomar, encantado.

O encargo, ali, era severo
Na 1ª Companhia d’Instrução,
Trinta soldados especializar
Daquele famigerado Batalhão.

Mas, eis que passados uns dias,
O 25 de Abril estalou,
Começou a pedir-se o fim da guerra
E nunca mais ninguém se calou.

É anunciado o fim da guerra
E, logicamente, fomos pensando
Que p’rá Guiné já não iríamos
E o tempo lá se foi passando.

As orientações superiores
Porém, mantinham-se inalteradas:
“Instrução contínua e inflexível…
Disciplina e moral elevadas”.

Passados dois meses sobre a revolução
Continuávamos mobilizados
E seguimos p’ra S.ta Margarida
Formar Batalhão e ser vacinados.

Até que a hora do embarque chegou,
O último Batalhão p’rá Guiné…
Tomava assento num avião…
Bissau e, horas depois, Cumeré!

Mais uns dias se passaram, pacatos,
E nova viagem… para Mansôa,
Pequena vila em terra Balanta
Onde sem a guerra... a vida era boa.

Assim, no dia 9 de Setembro,
Foi determinado superiormente
Entregar este quartel aos turras,
Oficial e cerimoniosamente.

- Você, entrega a cantina de manhã!...
- Diz o Comandante com resolução.
- E de tarde, vai arriar a bandeira...
- Avance firme e sem hesitação!

De manhã entreguei o estipulado
A um PAIGC com ar simplório
A arrecadação de géneros...
A cantina e o refeitório.

À tarde começaram a surgir pretos,
Às centenas, de todos os cantos,
A pé ou em camiões, amontoados;
Nunca pensei qu’eles fossem tantos.

A certo momento, todo a rigor,
Surgiu em marcha cadenciada
Um grupo de combate dos turras
E, mais atrás, uns pioneiros... em parada.

Muitos fotógrafos, jornalistas, e…
Convidados das Comunidades!
Após as apresentações da praxe
Deu-se início às formalidades.

Frente à nossa tropa ali formada,
Ondulava ao vento a Bandeira,
Parecia acenar um longo adeus
Àquela inóspita torreira.

Ao avançar para o velho mastro,
Pensava nas contradições do acto
Cada passo era um certificado,
Que o fim da guerra... era um facto.

Por a sua vida já não arriscarem
Os periquitos rejubilavam,
Enquanto tristes e conformados
Os ex-Combatentes choravam.

Toca o clarim… o Hino Nacional…
A nossa Bandeira foi retirada
E, para regozijo dos PAIGC
A deles, Guiné-Bissau, foi içada.

Nas fotos e entrevistas finais,
Entre tudo aquilo que foi dito,
Duas perguntas retive na memória
E penso dever ficar aqui escrito:

- Que pensa da política salazarista?...
- E sobre os qu’aqui perderam a vida?
- Os erros políticos pagam-se caros!...
- Pelos mortos, veneração sentida!

(...) A bandeira ondulava ao vento firme e formosa,
O mastro desceu, aprumada, em atitude imperial.
À multidão, ali em Mansôa, parecia afirmar:
- Aqui, esteve presente… o esplendor de Portugal!

Autoria e créditos fotográficos: © Magalhães Ribeiro (2005)

NÃO ERA UMA BANDEIRA QUALQUER

A Bandeira ondulava ao vento... firme e formosa,
Naquele alto e velho mastro do quartel... como voa,
O esplendor de Portugal garantia... assaz vaidosa.
Quanta veneração em sua honra... e quanta loa,
Tais façanhas heróicas dali presenciou... orgulhosa!
Bradai - às armas - lusitanos... se o inimigo soa,
Qu’Ela é o símbolo magno de união... gloriosa,
S’ameaça à Pátria algum inimigo... apregoa!
Qu’a garra deste povo... tem engenho e arte talentosa,
P’ra levar de vencida... que seja a besta em pessoa!
Qu’ali num naco d’África cumpriu de forma honrosa,
Dando mostras de valor indómito qu’inda hoje ecoa!
Até q’um dia no país se levantou tropa revoltosa,
Reformando a política do Ultramar... em Lisboa,
E qu’emanou então para Bissau determinação rigorosa;
Que em Portugal, a liberdade é bombarda qu’atroa,
E independência às colónias concedeu airosa,
Em assinatura... cuja data ainda hoje ressoa;
Nove de setembro de setenta e quatro... luminosa.
Também, nesse dia, a Bandeira foi arriada em Mansôa,
Pondo termo a séculos de História maravilhosa,
Pela derradeira vez... em cerimónia digna da “Coroa”,
Perante multidão exultante... e soldados da Nação briosa.
E, assim, a Guiné... sua sorte... embarcou em nova canoa!

Ranger Magalhães Ribeiro
Ex-Furriel Mil.º da CCS do Batalhão 4612/74
Mansoa/Guiné

Reportagem no Jornal Correio da Manhã, em 25 de Janeiro de 2009, onde abordam 2 factos que marcaram a presença do M.R. na Guiné:





M1 - Guiné/Binta - Um Furriel desenrascado

O meu nome é: José Eduardo Reis de Oliveira (JERO)
Fui Fur Mil da CCAÇ 675 (Binta, 1964/65)
Aqui apresento mais uma estória verídica, que faz parte do meu livro "Golpes de Mao's - Memórias de Guerra", a que dei o seguinte título:

Um Furriel desenrascado

É de todos os tempos, de todas as Unidades Militares, e até de todos os romances à base de conflitos bélicos ou passados em meios militares, uma figura, uma personagem típica, que em todas as circunstâncias, por mais difíceis que elas sejam, consegue «desenrascar-se» e arranjar para si e para os seus «compinchas», o melhor lugar, a melhor parte de um petisco ou a melhor parte de «alguma coisa» que um mortal comum nunca consegue ter antes deles.

Ora, como não podia deixar de ser, a «675» também tem entre os seus elementos esta personagem, que pediria meças, por exemplo, àquele cabo Kowalski, que a pena conhecida do célebre Hans Hellmut Kirst criou e deu vida no «08/15 – A Caserna», embora este seja apenas «desenrascado» e não brigão como o cabo alemão, frequentemente metido em complicações por isso mesmo.
É transmontano, «duro», infatigável, leal e amigo do seu amigo, como é apanágio das gentes daquelas regiões altas e pedregosas do nosso Portugal, um bom combatente, um excelente chefe de secção, estimado pelos seus homens, pelos seus camaradas e pelos seus superiores, caçador, cozinheiro de bons petiscos, excelente «garfo» que todos os dias consegue ter no seu prato, mesmo quando na Companhia há só feijão ou conservas, por falta de géneros, uma perdiz, um pato ou uma lebre, e uma cerveja ou um copo de vinho gelado quando todos os outros o não conseguiram.

Chama-se Luís Correia da Cruz Moreira, este Furriel «desenrascado » que como não podia deixar de ser tinha o melhor lugar na camarata onde dorme com os seus amaradas, uma secretária por sua conta para escrever à família (enquanto os outros o fazem às vezes apenas em cima de um caixote...) e outras comodidades que o seu «engenho e arte» conseguiram.

São inúmeras as histórias dos seus «desenrascansos» mas vamos só contar uma que, por decorrer em ambiente difícil, revela melhor o seu espírito e as «qualidades» que temos vindo a referir.

No meio do mato, no decorrer de uma operação que fez estar instalado o seu grupo de combate durante uma semana frente a Farim, na margem do Rio Cacheu que dava acesso ao “K 3”, para manter uma «testa de ponte», ele conseguiu «desenrascar» das outras «forças» que cooperavam na acção, os mantimentos necessários para melhorar a sua alimentação e a dos seus camaradas, fazendo alguns petiscos de sabor divinal, atendendo às circunstâncias difíceis em que todos se encontravam.

Até da dispensa do navio de guerra, que apoiava a operação, ele conseguiu nescafé, e só não tiveram pudim em plena «guerra» porque isso até parecia mal e mais tarde quando o contassem ninguém acreditaria...

Mas se lá está mais tempo era capaz de ter conseguido por intermédio dos «T6», que por vezes davam apoio aéreo às operações, uns camarões vindos directa e expressamente de Bissau. É que o que ele não conseguir ninguém mais o conseguirá...

Também era possuidor de um sentido de humor muito especial e algumas das suas partidas ficaram para a história.

Vamos relatar só uma que conhecemos particularmente bem pois fomos o “otário” de serviço...

Já tínhamos uns largos meses de mato e já se faziam contas de “diminuir” em relação à data de regresso.

Por causa da minha mania das escritas deitei-me uma noite particularmente tarde.

Quando cheguei ao meu “quarto particular”, que partilhava com o nosso 1º.Santos e o Furriel Cravino, já toda a gente dormia.

No “quarto” ao lado, onde estavam hospedados mais uns 3 ou 4 furriéis , pareceu-me ouvir uns “cochichos”mas não liguei. Estava cheio de sono.

Com o clima tropical não se usava muita roupa para dormir e rapidamente levantei o mosquiteiro para me estender... vestido só com o relógio!

Engano meu...

Mal levantei o mosquiteiro sai-me uma galinha do interior, situação de todo inesperada que me fez desequilibrar e gritar a meio da noite:

Mas que merda é esta!?

Tive que acordar os meus companheiros de quarto e com a ajuda de uma “pilha” percebi que, até onde a minha vista alcançava, os lençóis estavam todos borrados. Incrivelmente cagados e mal cheirosos!

Comecei a coçar a cabeça e a perguntar a mim mesmo como é que o raio da galinha tinha ido parar dentro do mosquiteiro!

Entretanto já tinha uma quantidade de “sacanas” perto de mim que gozavam “o prato” e que, entre gargalhadas, “lamentavam a sorte do Oliveira”.

De facto, em tantos meses de mato, nunca tinha acontecido a ninguém uma daquelas...

E agora como é que eu safo? Onde é que vou dormir?

Eis se não quando aparece o Moreira com dois lençóis lavados.

Ajudou-me a tirar os”borrados” – a galinha já tinha sido corrida a pontapés – e fez-me a cama de lavado.

Gajo porreiro.

Deitei-me e... pensava eu que ia dormir.

Mas... poucos minutos depois... tinha comichão por todo o lado e cada vez que me virava parecia-me que estava a ser comido vivo...

Mas que merda é esta (parte dois)!?

Com o auxílio da pilha lá investiguei o interior do mosquiteiro e pareceu-me ver milhares de minúsculos “pontos negros”!

Mas que merda é esta (parte três)!?

Os “pontos negros” deslocavam-se e afinal eram piolhos!

Está claro que tive de me levantar... sem saber muito bem o que havia de fazer.

Mais uma vez apareceu por perto o Moreira para dar uma “mão”.

Ajudou-me a desmontar o “cenário” para... sacudir o material.

Mosquiteiro e... lençóis lavados!

Informaram-me entretanto os mirones que os piolhos eram da galinha.

Grande consolação.

Lá aumentei a minha cultura geral e -depois de mais uma vez agradecer ao Moreira - esfreguei-me todo com álcool e tentei dormir.

O que foi... mentira.

Ainda tentei contar carneiros a saltar mas... só dava piolhos.

Por espantoso que pareça nunca me passou pela cabeça que toda aquela “cena” tivesse sido montada.

Meses depois, já a bordo do “Uíge”, quando regressávamos a Lisboa é que soube que a galinha”tinha aterrado” dentro do meu mosquiteiro graças a uma mão malandra.

A mão do Moreira, está claro.

Grande sacana.

Ainda hoje acho incrivelmente engraçada toda a “estória” que, julgo eu, terá ultrapassado o enredo inicial , pois a caganeira da galinha (e os piolhos) não deviam estar previstos no guião primitivo, o que motivou as “ajudas suplementares” de que fui alvo daquela noite engalinhada!

Luís Moreira o tipo acabado de “um bom malandro”...

Quarenta e tal anos depois... o Luís Moreira está na mesma... ou quase!

Depois de algumas voltas na vida ficou-se pelo Porto.

É empresário individual e trabalha que se farta na área dos... presuntos.

Passa muito do seu tempo a viajar.

Não pára e só não dorme na sua carrinha porque tem que ir de vez em quando a casa para ver a mulher e... os netos...

Obviamente que continua desenrascado e com uma “lata” que só visto.

A “estória” que se segue passou-se já há algum tempo (mas como os eventuais ilícitos criminais podem ainda não ter prescrito...) é relatada sem nomes nem indicação de locais...

O nosso Moreira levanta-se normalmente cedo e vai para a estrada quando às vezes o sol ainda não se levantou.

Dirigia-se a Espanha com a carrinha carregada de presuntos.

O livro das guias de remessa seguia, como de costume, no porta luvas.

À posteriori conta o Moreira que, antes de sair do seu armazém, tinha mesmo pensado em preencher as respectivas guia mas...era ainda tão cedo que... não deu!

Já perto da fronteira foi mandado parar por uma brigada de trânsito. A continência da ordem e o pedido habitual.

– Os seus documentos, por favor.

O Moreira nem lhes deu tempo para dizer mais nada.

– Oh Senhor Guarda . Hoje você e o seu colega deviam jogar no totoloto ou comprar lotaria. Mas que pontaria com que vocês estão. Hoje vocês ganhavam o “Euro milhões”. É incrível.

Não vão acreditar mas levo a carrinha carregada de presuntos, tenho aqui o livro das guias de remessa e com a pressa saí de casa sem as preencher.

– É formidável. Deviam jogar no totobola, na lotaria... eu sei lá Vocês estão cá com uma pontaria.
E... repetia-se, repetindo os argumentos da sorte e do jogo até à exaustão.

Não se calava e os guardas olhavam um para o outro... sem palavras. Que “freguês” para começar o dia!

Num dos intervalos do “arrazoado” do Moreira um dos guardas pediu-lhe para se calar.

– Preencha lá as guias e siga.

Poucos dias depois estavam os três a almoçar algures na zona do Porto Alto.
A atitude pedagógica dos guardas granjeou dois novos amigos para o Moreira. Que ainda hoje se mantêm!

E se não ganharam o “Euromilhões” ganharam um amigo especial.

Luís Moreira além de “um bom malandro”... é também um amigo para a vida e para a morte.

A “família da 675” faz-lhe essa justiça.

JERO

M1 - Guiné/Binta - Histórias do Jero: “O Padre eterno”

José Eduardo Reis de Oliveira (JERO), fui Fur Mil da CCAÇ 675 (Binta, 1964/65), aqui conto uma estória verídica, que faz parte do meu livro "Golpes de Mao's - Memórias de Guerra":

O PADRE ETERNO

O «Padre Eterno» não era alcunha. É apenas o apelido – algo invulgar – do Firmino, alentejano de corpo inteiro.
Nado e criado em Borba e de nome completo Firmino Carola Padre Eterno.O Padre Eterno foi um militar “especial” na Companhia.
Até se poderá dizer “especial de corrida” porque foi condutor-auto.
Depois de ter andado de “cu tremido” e no “bem bom” uma boa temporada na Metrópole como condutor do Coronel Braancamp Sobral, em diversas unidades militares... um dia... acabou-se-lhe a “mama”.E foi mobilizado.

O Padre Eterno à civil em Bissau
Obviamente na “5ª.Rep.”

Foi para a Guiné incorporado na C.Caç. 642, do Batalhão dos Águias Negras como 1º. Cabo Condutor-Auto e por causa de um “levantamento de rancho”... foi punido com 15 dias de prisão disciplinar agravada, despromoção a soldado raso e transferido para outra Unidade.
Calhou-lhe a “675”. Obviamente que na vida militar não é o melhor “cartão de visita” chegar a uma Companhia isolado e “sem para quedas” e com a fama de ter estado metido num "levantamento de rancho".
Teve a sorte de encontrar um Comandante de Companhia como o Capitão Tomé Pinto que lhe “leu” de imediato “a cartilha”...
– O que se passou anteriormente não me interessa. Interessa-me o teu comportamento na C.Caç. 675 a partir desta data. Se te portares bem não vais ter problemas... E recomendo-te que o faças.
O Padre Eterno nunca esqueceu “a recomendação” e entrou na família da “675” como "gente grande".
“Entrou” tão bem que parecia que nunca tinha estado noutro lado.
Bem disposto, brincalhão, mas atilado e excelente operacional.
Foi devido à sua “ratice” que localizou uma mina anti-carro no dia da operação de Sambuiá – 5 de Janeiro de 1965 – e evitou uma tragédia, que podia ter causado mortos e feridos.
A sua versão do levantamento de rancho ( de que foi acusado) é anedótica mas na vida militar uma palavra a destempo pode ser... ”a morte do artista”...
O Padre Eterno chegou atrasado a uma formatura para o jantar, desconhecendo que estava iminente um levantamento de rancho, e “caiu” como um “pato” quando o Oficial de Dia chegou à formatura.
– Quem são aqui os “meninos finos”?
– Quem é que não quer comer?
O Firmino não conseguiu ficar calado, como convinha, armou-se em “engraçado” e “lixou-se”:
– Eu é que não janto. Recebi hoje uma encomenda de casa com um paio – daqueles de comer e chorar por mais – e tive um lanche daqueles à antiga. Eu é que não vou comer.
Efectivamente não comeu do rancho mas “comeu” um castigo que... lhe estragou a digestão.
Apesar da azia dos dias seguintes teve a “sorte grande” de ter ido parar à “675”.
Onde foi um militar estimado por toda a gente.
Tinha sempre uma “estória” da sua terra para contar e, mesmo repetidas, os seus ditos causavam sempre gargalhadas no aquartelamento.
Sem dúvida que o apelido – Padre Eterno – ajudava e, não sendo alcunha, passou à história da companhia como sendo o filho do principal sócio de um armazém de vinhos de Borba. O nome da firma em causa deixava sempre a rapaziada de boca aberta e convencida de que o Firmino estava “a regar”.
Mas não estava.
Mais tarde quando fomos ao seu casamento a Borba foi-nos confirmado que o Pai do Firmino tinha sido mesmo um dos sócios da firma “Padre Eterno & Salvador das Almas, Armazém de Vinhos !!!

E depois há aquela estória da “sandes de atum” que arranjou ao “Caldas”, quando ele estava no Hospital Militar de Bissau, cujo crédito já “chegou” ao Céu...

Firmino já um pouco longe do “estado novo” mas ainda em boa forma.
(Foto de Maio de 2009, em Évora). Foto do autor

Firmino Carola Padre Eterno alentejano puro e membro ilustre da “Família 675”.
E quer se queira quer não dá sempre jeito ter por amigo um “Padre” que... ainda por cima é “Eterno”...

Um abraço,
JERO
Fur Mil Enf da CCAÇ 675