sábado, 1 de junho de 2013

M-447 SERVIÇO DE URGÊNCIAS

Os homens e mulheres de ”bata branca” também choram…
A história de vida que se segue nunca antes foi contada em jornais.
A enfermeira Lucília Assunção já não recorda nomes. Passaram muitos anos. Mais de trinta.
Mas uma noite de gritos, de choros lancinantes, de lágrimas no Serviço de Urgências do Hospital de Alcobaça ainda continua presente num recanto da sua memória.
Vivia os seus primeiros tempos de enfermeira.
 Estava de serviço, nas “Urgências”, com o Dr. José Pedrosa.
Chegou uma ambulância. Três macas deram entrada no “Banco”. Um miúdo de uns 8 ou 9 anos e dois idosos, seus avós, eram já cadáveres. Confirmados os óbitos os corpos seguiram para a morgue, que ficava perto.
Logo a seguir, num veículo ligeiro, chegou um casal jovem. Os pais do miúdo. Confrontados com a situação ficaram estarrecidos. Desesperados, inconsoláveis.
Perante tal perda que dizer e que fazer àqueles pais !?
A enfermeira Lucília recorda que eram pessoas do norte do País. De que vila ou cidade já não se consegue lembrar. O avô seria Juiz de Direito.
O pai do miúdo tinha estado algum tempo fora de Portugal e a sua família tinha vindo esperá-lo ao aeroporto de Lisboa.
 Depois dos abraços e da alegria do reencontro tinham encetado a viagem de regresso em dois carros.
 Os avós e o neto num carro e o jovem casal noutro.
Quando passavam na região de Alcobaça um dos carros despistou-se e bateu violentamente contra uma árvore (!?).
Os bombeiros foram chamados e trouxeram as vítimas para o Hospital.
Seguiu-se o reencontro do jovem casal com os seus familiares. O médico e a enfermeira fizeram o que sabiam  - e não sabiam – para os acalmar e confortar.
A certa altura enfermeira Lucília Assunção não aguentou mais e saiu momentaneamente da sala. Foi chorar para trás de um biombo. O médico apareceu-lhe pouco depois e disse-lhe:« Então senhora enfermeira? A chorar? Preciso de si lá dentro . E sem lágrimas.»
A enfermeira voltou. E continuou a tratar dos vivos. Foi uma noite longa.
 Quando terminou o serviço e voltou a sua casa não conseguiu dormir um minuto.
No dia seguinte conversando com a mulher do Dr. Pedrosa, que também trabalhava no hospital, esta comentou. “Ontem foi mesmo um dia trágico. Nunca vi chegar a casa o meu marido assim. Quando chegou disse-me logo. Nunca mais os nossos filhos vão viajar noutro carro que não seja o nosso. Não pregou olho toda a noite.”
O tempo passou. E muitas noites de “urgências” se seguiram. Mas tão dramática como aquela em que o seu “chefe” a tinha chamado à atenção por estar a chorar…não voltou a acontecer.
Mas de uma coisa tem a certeza … que os homens e mulheres de ”bata branca” também choram.
 Mas tentam não o fazer à vista dos que necessitam dos seus serviços.
 Porque faz parte do seu trabalho evitar as lágrimas dos outros.
 As suas…ficarão sempre para outro ...
De preferência…sem ninguém por perto !
JERO




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