segunda-feira, 17 de setembro de 2012

M - 431 ALMA ATÉ ALMEIDA...


De vez em quando…uma viagem ao passado

A primeira paragem foi em Tondela. 
O Belmiro Tavares e a sua mulher, Luísa, tinham partido de Lisboa e deram-me boleia a partir de Alcobaça.
 Para ali chegar já tínhamos andado uns bons quilómetros. Em números redondos cerca de 300.
Entrámos no cemitério e encontrámos a campa do 1º.Cabo Enfermeiro  António da Silva Martins sem dificuldade. 
O Tavares já cá tinha estado anteriormente.
 Eu vi pela primeira vez a sepultura do “Rato”, alcunha por que ficara conhecido por toda sua Companhia – a nossa CCaç.675. 
Em 1970 não tinha resistido a um acidente de motorizada numas fatídicas férias que passou na sua terra natal. Contava 28 anos.
 Anteriormente tinha vivido – ou sobrevivido - em Lisboa, após o regresso da Guiné .
 Na sua humilde sepultura estavam também a mãe e uma irmã (Maria Manuela Silva Martins Neves Antunes – 1946/1998), conforme informação do coveiro, que nos acompanhou na visita. O pai também já tinha falecido e o nosso solícito informador nada mais nos conseguiu dizer sobre familiares do Martins, que estivessem vivos.
Depois do nosso regresso da Guiné em Maio de 1966 os primeiros reencontros entre camaradas da guerra haviam acontecido por causa de casamentos, que aconteceram quase por todo o País. Depois do nosso regresso para a vida o “Rato” fora o primeiro a encontrar a morte.
 Todas estas recordações me passaram pela cabeça enquanto colocávamos a lápide na campa nº. 31 do nosso camarada: PRESENTE /António Martins/ 1º.Cabo Enfermeiro/ Os Companheiros.
Abandonámos o cemitério.
 Antes de sair da cidade visitámos ainda a Igreja Matriz de Tondela.
Continuava a “ver” o “Rato” com o seu sorriso inconfundível, que fazia parte da sua imagem de marca.
 Irreverente, malandro, irresistível no quartel e na tabanca com as “bajudas”, mas valente e desenrascado no “mato”.
 Voltara da guerra sem um arranhão e, dois anos depois, morreu num desastre de viação. Num tempo em que não havia telemóveis a notícia da sua morte chegou-me algo atrasada. 
Felizmente que alguns meses antes tinha-o conseguido levar a casa dos meus pais, em Alcobaça, onde tinha sido tratado como um filho. Esse tempo feliz ficou-me gravado na alma.
Seguimos depois para Freinedo, junto a Vilar Formoso, onde nos deslocámos para honrar a memória de outro camarada: - António de Jesus de Encarnação, que fora 1º.Cabo rádio telegrafista.
Cabe aqui fazer um pequeno parêntesis para recordar que durante a permanência da Guiné (1964-66) tivemos 3 mortos em combate:
 - Furriel Miliciano Mesquita 
-  Soldado Gonçalves e
-  Soldado Nascimento.

 Depois, pela ordem natural da vida, que envolve a morte, “deixaram” a família da CCaç. 675 mais 4 dezenas de camaradas.

 Graças à iniciativa do ex-Alferes Miliciano Belmiro Tavares temos, desde há uns anos a esta parte, vindo a colocar lápides nas suas sepulturas com a mensagem de PRESENTE, que faz jus ao lema da Companhia, que no seu emblema referia “Nunca Cederá”.
Na visita à sepultura do Encarnação, que faleceu em 2008 com 66 anos de idade, tivemos a companhia de uma sua filha, que também reside em Freinedo. Ficámos a saber que o nosso antigo camarada foi emigrante em França, durante grande parte da sua vida.
No dia seguinte cumprimos um “programa” diferente, dedicado aos “vivos”. Fomos ao encontro de 2 camaradas que residem perto de Almeida, uma terra com história e com alma…até Almeida(1).
Como o Belmiro Tavares gosta de dizer fizemos nessa tarde um “mini-convívio” da “675”.
Reencontrámos o António Alberto Nunes Espinha, por alcunha o ”Cara Rota”, e o Silvestre Fernando Verges Flor, que passou à história como o “Aguardente”. Vá lá saber-se porquê !
São agora “rapazes” com 70 anos e a vida marcou-os de maneira diferente. Curiosamente o “Aguardente” afastou-se da dita e passa a imagem de um homem tranquilo, com “as coisas” todas bem arrumadas. Em relação à sua idade actual passou mais tempo em França que em Portugal. Está bem na vida. O “Cara Rota” vê-se que é um homem desenrascado, que conhece bem o solo que pisa e que vive o seu dia …”à sua maneira”. De manhã bebe uns “copos” com uns amigos. À tarde faz “alguma coisa” e, logo que está livre, joga à sueca com uns parceiros habituais. E o tempo vai-se passando.

Espinha, Tavares, Luísa, Flor e JERO
Prometeram comparecer no próximo convívio da CCaç.675, desde sempre marcado para o 1º domingo do mês de Maio de cada ano.
 E já passaram 46 anos desde que o navio “UÍGE” nos transportou de Bissau para Lisboa, onde aportámos em Alcântara em 3 de Maio de 1966.
Para uma próxima “agenda”, a cumprir ainda este ano, temos para entregar as placas do Alferes Miliciano Artur Mendonça(Felgueiras) e do 1º. Cabo Cozinheiro Rogério Romão (Sabrosa/Vila Real).
 O Belmiro Tavares e sua mulher ficaram mais uns dias no “Retiro dos Caetanos”, em Souto Chão (Rocas do Vouga), que foi o nosso” quartel-general”. Grato pela hospitalidade regressei a casa pelos “meus meios” e com a ajuda da Rodoviária Nacional.
 Desta jornada de saudade a recordação mais viva, mais marcante foi a visita à campa do “Rato e ter visto a sua fotografia sumida, esfumada, apagada pelo tempo.
 Encaixada na sua lápide do cemitério de Pinhel.
Que saudades eu tenho do “puto” irreverente da Guiné dos longínquos anos de 1964-66 em Binta,
 na Vila Tomé Pinto !
Desse tempo que não volta e do tempo que corre e…não se detém .

Quanto mais tempo andaremos nesta saga ???
Num dia recordámos os mortos. No dia seguinte confraternizámos com os vivos !!!
Todos nós sabemos que só uma coisa é certa…
 Mas …a nossa amizade NUNCA CEDERÁ.
JERO


(1)- Evoca este grito –“ alma até Almeida” - a importância que teve Almeida, fortaleza que só passou a integrar definitivamente território português no século XIII, com a celebração do Tratado de Alcanizes, na defesa de toda a Beira, face às muitas incursões castelhanas, e a valentia com que os seus guardiões disso fizeram um ponto de honra.

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