De vez em quando…uma viagem ao
passado
A primeira
paragem foi em Tondela.
O Belmiro Tavares e a sua mulher, Luísa, tinham partido
de Lisboa e deram-me boleia a partir de Alcobaça.
Para ali chegar já tínhamos
andado uns bons quilómetros. Em números redondos cerca de 300.
Entrámos no
cemitério e encontrámos a campa do 1º.Cabo Enfermeiro António da Silva Martins sem dificuldade.
O
Tavares já cá tinha estado anteriormente.
Eu vi pela primeira vez a sepultura
do “Rato”, alcunha por que ficara conhecido por toda sua Companhia – a nossa
CCaç.675.
Em 1970 não tinha resistido a um acidente de motorizada numas
fatídicas férias que passou na sua terra natal. Contava 28 anos.
Anteriormente
tinha vivido – ou sobrevivido - em Lisboa, após o regresso da Guiné .
Na sua
humilde sepultura estavam também a mãe e uma irmã (Maria Manuela Silva Martins
Neves Antunes – 1946/1998), conforme informação do coveiro, que nos acompanhou
na visita. O pai também já tinha falecido e o nosso solícito informador nada
mais nos conseguiu dizer sobre familiares do Martins, que estivessem vivos.
Depois do
nosso regresso da Guiné em Maio de 1966 os primeiros reencontros entre
camaradas da guerra haviam acontecido por causa de casamentos, que aconteceram
quase por todo o País. Depois do nosso regresso para a vida o “Rato” fora o
primeiro a encontrar a morte.
Todas estas
recordações me passaram pela cabeça enquanto colocávamos a lápide na campa nº.
31 do nosso camarada: PRESENTE /António Martins/ 1º.Cabo Enfermeiro/ Os
Companheiros.
Abandonámos
o cemitério.
Antes de sair da cidade visitámos ainda a Igreja Matriz de Tondela.
Continuava a “ver” o “Rato” com o seu sorriso inconfundível, que fazia parte da
sua imagem de marca.
Irreverente, malandro, irresistível no quartel e na
tabanca com as “bajudas”, mas valente e desenrascado no “mato”.
Voltara da
guerra sem um arranhão e, dois anos depois, morreu num desastre de viação. Num
tempo em que não havia telemóveis a notícia da sua morte chegou-me algo atrasada.
Felizmente que alguns meses antes tinha-o conseguido levar a casa dos
meus pais, em Alcobaça, onde tinha sido tratado como um filho. Esse tempo feliz
ficou-me gravado na alma.
Seguimos
depois para Freinedo, junto a Vilar Formoso, onde nos deslocámos para honrar a
memória de outro camarada: - António de Jesus de Encarnação, que fora 1º.Cabo
rádio telegrafista.
Cabe aqui
fazer um pequeno parêntesis para recordar que durante a permanência da Guiné
(1964-66) tivemos 3 mortos em combate:
- Furriel Miliciano Mesquita
- Soldado Gonçalves e
- Soldado Nascimento.
Depois, pela ordem natural da vida, que
envolve a morte, “deixaram” a família
da CCaç. 675 mais 4
dezenas de camaradas.
Graças à iniciativa do ex-Alferes Miliciano
Belmiro Tavares temos, desde há uns anos a esta parte, vindo a colocar lápides
nas suas sepulturas com a mensagem de PRESENTE, que faz jus ao lema da Companhia,
que no seu emblema referia “Nunca Cederá”.
Na visita à
sepultura do Encarnação, que faleceu em 2008 com 66 anos de idade, tivemos a
companhia de uma sua filha, que também reside em Freinedo. Ficámos a saber que
o nosso antigo camarada foi emigrante em França, durante grande parte da sua
vida.
No dia
seguinte cumprimos um “programa” diferente, dedicado aos “vivos”. Fomos ao
encontro de 2 camaradas que residem perto de Almeida, uma terra com história e
com alma…até Almeida(1).
Como o
Belmiro Tavares gosta de dizer fizemos nessa tarde um “mini-convívio” da “675”.
Reencontrámos
o António Alberto Nunes Espinha, por alcunha o ”Cara Rota”, e o Silvestre Fernando
Verges Flor, que passou à história como o “Aguardente”. Vá lá saber-se porquê !
São agora
“rapazes” com 70 anos e a vida marcou-os de maneira diferente. Curiosamente o
“Aguardente” afastou-se da dita e passa a imagem de um homem tranquilo, com “as
coisas” todas bem arrumadas. Em relação à sua idade actual passou mais tempo em
França que em Portugal. Está bem na vida. O “Cara Rota” vê-se que é um homem
desenrascado, que conhece bem o solo que pisa e que vive o seu dia …”à sua
maneira”. De manhã bebe uns “copos” com uns amigos. À tarde faz “alguma coisa”
e, logo que está livre, joga à sueca com uns parceiros habituais. E o tempo
vai-se passando.
Espinha, Tavares, Luísa, Flor e JERO
Prometeram
comparecer no próximo convívio da CCaç.675, desde sempre marcado para o 1º
domingo do mês de Maio de cada ano.
E já passaram 46 anos desde que o navio “UÍGE”
nos transportou de Bissau para Lisboa, onde aportámos em Alcântara em 3 de Maio
de 1966.
Para uma
próxima “agenda”, a cumprir ainda este ano, temos para entregar as placas do
Alferes Miliciano Artur Mendonça(Felgueiras) e do 1º. Cabo Cozinheiro Rogério
Romão (Sabrosa/Vila Real).
O Belmiro Tavares e sua mulher ficaram mais
uns dias no “Retiro dos Caetanos”, em Souto Chão (Rocas do Vouga), que foi o
nosso” quartel-general”. Grato pela hospitalidade regressei a casa pelos “meus
meios” e com a ajuda da Rodoviária Nacional.
Desta jornada de
saudade a recordação mais viva, mais marcante foi a visita à campa do “Rato e ter
visto a sua fotografia sumida, esfumada, apagada pelo tempo.
Encaixada na sua
lápide do cemitério de Pinhel.
Que saudades
eu tenho do “puto” irreverente da Guiné dos longínquos anos de 1964-66 em
Binta,
na Vila Tomé Pinto !
Desse tempo
que não volta e do tempo que corre e…não se detém .
Quanto mais
tempo andaremos nesta saga ???
Num dia
recordámos os mortos. No dia seguinte confraternizámos com os vivos !!!
Todos nós
sabemos que só uma coisa é certa…
Mas …a nossa amizade NUNCA CEDERÁ.
JERO
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