O PESADELO
Numa destas últimas noites de Inverno tive um pesadelo terrível, que me levou a acordar entre suores e espanto por volta das 3 horas da manhã.
Da garganta da Fervença ,o local mais frio dos arredores de Alcobaça, soprava um vento glacial que fazia pousar nas varandas, nos postes de iluminação, nos sinos do Mosteiro, uma finíssima camada de gelo.
Dir-se-ia que com o vento vinham vozes, como direi, algo entre o gemido e o grito.
Os sonhos são quase sempre paradoxais, por isso, com os ventos gélidos e as vozes inteligíveis apareciam pedaços de máquinas, moldes inteiros, ânforas sem asa, pratos quebrados, inúmeros pés de copos de cristal, toalhas de algodão em farrapos, latas ferrugentas de calda de pêssego, pedaços soltos de marmelada, misturados com peras e maçãs.
Tudo rodopiava no meio do vento e dos gemidos, às vezes dos gritos.
Uma luz claríssima abriu-se por entre canteiros de flores de todas as cores, de todas as formas, de todos os tamanhos. E …lembro-me de haver pássaros que não voavam. Seguiam colados às compotas, aos vidros, aos moldes na direcção de Évora, de Turquel, de Lisboa.
Um multidão irada, de vestes rasgadas corria, direi, flutuava sobre o inóspito terreiro do Rossio.
Um velho acocorado junto ao Correio ergueu-se no fim do pesadelo …repetindo:
O melhor de Alcobaça é a estrada para Leiria, ou para as Caldas, disse o turista japonês.
Que pesadelo tão estúpido.
Alcobaça é uma terra milenar, cuja origem se perde no tempo e todos os lugares feitos pelos homem têm crises ao longo da vida, tal qual os seus construtores.
O problema é que às vezes os sonhos são premonitórios.
Pois bem, talvez Alcobaça necessite de um projecto de desenvolvimento sustentável com padrão territorial. E de novos equilíbrios sócio económicos que tragam novos fôlegos económicos a médio e longo prazo , bem programados e consolidados.
Quando acordei o sol ia alto.
No rádio ao lado da cama, quase em surdina, ainda ouvi um jornalista radiofónico a dizer que era vital repensar a actividade turística no contexto socioeconómico de Alcobaça e divulgar os valores da identidade cultural.
Desliguei o rádio e fui para o duche.
Rui Rasquilho
(foto JERO
em Alcobaça
5 minutos depois das 3 da manhã...)
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