INTERVENÇÕES
O Claustro da Hospedaria, que foi prisão em rudes tempos
patrimoniais, esteve longos anos ao abandono.
No ano 2000, intervenções arqueológicas levaram, entre
outras descobertas, ao aparecimento do portal gótico que até ao sec. XVI servia
de ligação entre o Claustro de D.Dinis e o terreiro, servido nessa altura por
uma escadaria que atenuava o desnível entre um e outro.
Curiosamente as autoridades patrimoniais continuam
lamentavelmente a ignorar que o Claustro do Palácio não é de “D.Afonso VI” e o
da Hospedaria não se denomina de “Cadeia”.
Um dia o bom senso científico
prevalecerá sobre os lapsos.
O Claustro da Hospedaria foi recuperado (1º.piso) em 2005 no
que respeita a janelas, paredes exteriores, tectos de madeira e paredes
interiores.
No piso térreo, os paramentos, devido a saída da cadeia
continuavam picados e não havia revestimento de piso. Alguém terá pintado as
cantarias de amarelo.
Por volta de 2005 a AMA-Associação de Amigos do Mosteiro de
Alcobaça apresentou um projecto de recuperação deste espaço pois considerava
que o Claustro da Alta Renascença do Palácio Abacial, construído no tempo do
Abade Comendatário D.Henrique, e a Portaria muito alterada e o Claustro da
Hospedaria, construído no sec. XVII, deviam integrar o circuito de visita ao Monumento.
A Sala de Conclusões foi então limpa (aí funcionou a
Repartição de Finanças até 1986) e
pensou-se poder aí instalar a nova loja, ligada directamente à Praça 25 de
Abril.
Bem que o actual director desejava cumprir este projecto. Mas…
Acontece que em dado momento, creio que haverá cerca de um
ano, o IGESPAR resolveu seguir as recomendações dos Amigos do Mosteiro e
rebocar paredes e tetos à base de cal e lajear o solo.
Tudo bem, mas houve um desastre, o vão, da tal ligação
medieval do Claustro do Silêncio ao Terreiro.
Com a decisão de construir “um
desenho sóbrio e contemporâneo”, cobriram o que estava à vista do vão gótico e
os silhares de pedra do arranque da porta medieval.
Não entendeu o decisor que poderia ter conciliado o vão mais
antigo e o vão menos antigo e vai daí tirou tudo com o argumento usado na
arqueologia horizontal – tapa-se. E assim conserva-se.
Alexandra Gesta disse um dia: transformar não implica
destruir nem reproduzir. Foi o que se fez em 1980 na Casa dos Bicos, em Lisboa.
Afirma a citado arquitecta(*) que é necessário produzir novos valores a partir
dos existentes.
O novo “valor” da ligação citada, foi o apagamento da
memória, considerando-se esta “requalificação” uma intervenção moderna do vão.
Tenho pena que hoje em dia ninguém oiça ninguém quando
intervém no terreno que mal conhece e amputa a leitura histórica, mesmo tendo
tido à disposição imagens e relatórios que deveriam ter impedido o gesto de
diluição, continuando afinal o erro que se fez no terreiro destruindo a escada
no eixo do portal medieval com o desenho do novo terreiro.
Rui Rasquilho
Membro fundador do ICOMOS-Portugal.
(*)- Por lapso está referido que Alexandra Gesta é “arquitecta”,
quando na verdade é uma especialista da área de salvaguarda do património com trabalhos feitos
na cidade de Guimarães, onde foi responsável pela reabilitação do Centro Histórico.
Sem comentários:
Enviar um comentário