O TIBÚRCIO
À distância no
tempo recordo um “homem feito” que dormia na rua e que fazia a sua higiene
matinal numa “fonte” situada aos pés da estátua de São Bernardo, na Praça da
República.
Na então vila
de Alcobaça o Tibúrcio era muito conhecido. Por variadas razões mas
principalmente por estar sempre na rua...e por todo o lado!
Na aldeia onde
nasceu poucos tinham o que precisavam e o caso dele não foi exceção. Pior do
que isso, o Tibúrcio saltou para a vida sem as defesas suficientes e
rapidamente se integrou nos desprotegidos da sorte. E deu tanto “nas vistas”
que alguém, bem-intencionado, o meteu num asilo de mendicidade.
“Ajuda” que não resultou.
Como “ave de campo não quer capoeira”, logo ao
segundo dia, o Tibúrcio fugiu para bem longe, só regressando alguns meses mais
tarde, depois de lhe terem garantido que não teria de voltar para o que
considerava ser pior do que a cadeia.
Pelo tempo fora, foi vivendo incertamente, amigo dos
gatos e dos cães, com os quais partilhava escassos pães ou minguadas
sopas que algumas almas generosas lhe abonavam.
Trabalho ou
ofício fixos nunca teve porque não aceitava cumprimento de horários. Mas não
era preguiçoso.
Chegou mesmo a
montar caixa de engraxador junto à Farmácia Campeão. Por vezes, acontecia
que um ou outro cliente saía com peúgas e sapatos engraxados por igual… E, vá
lá saber-se porquê, esse “bónus” não agradava à generalidade das pessoas. Encerrou
esses “negócio” e optou por fazer recados.
Porque o
Tibúrcio não mendigava, limitava-se a oferecer a sua força de trabalho.
Quando a paga
era boa, ala para o Beco do Grilo, onde numa tasca “à maneira” matava velhas
sedes, até ficar um pouco zonzo.
Numa noite
invernosa foi surpreendido pela chuva e como estava perto do Hospital refugiou-se
na casa mortuária, onde terá entrado por a porta estar mal fechada…
Aconchegou-se a um canto e adormeceu.
Altas horas da
madrugada duas auxiliares de enfermagem - de apoio ao banco de urgências - tiveram
a desagradável incumbência de transportar a vítima mortal de um acidente para a
casa mortuária. Carregaram o cadáver numa maca até ao local. Abriram e porta e um
grito inesperado vindo do fundo da sala quase as matou: «fechem a porta que
está frio». Fugiram esbaforidas… e o Tibúrcio teve que se levantar mais cedo.
À
distância no tempo, já um pouco desvanecido na bruma da distância, não o
esqueço.
É só passar pela “fonte” situada aos pés da
estátua de São Bernardo… e lá está ele!
JERO
Caro JERO
ResponderEliminarNão há melhor título que este para comemorar o reviver deste teu blogue, "Fechem a porta que está frio"... É que eu até pensava, com esta paragem prolongada, que o blogue tinha ficado congelado!...
Abraço. Miguel Pessoa
Obrigado Miguel. Está de novo aberto...para o que der e vier.Grande abraço.JERO
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