sexta-feira, 23 de maio de 2014

M- 472 A PRIMEIRA VIDA DA SPAL-SOCIEDADE DE PORCELANAS DE ALCOBAÇA,LDA.

A primeira vida das porcelanas SPAL

A ideia inicial, que viria a dar origem à Fábrica de porcelanas SPAL, nasce em 1965 de um conjunto de boas vontades de responsáveis de três fábricas de faiança da região de Alcobaça: Raul da Bernarda, Lda., que tem poder financeiro, Olaria de Alcobaça, Lda., que tem sócios com influência política, e Elias e Paiva, a Fábrica da “Pouca Sorte”, que detém um alvará para o fabrico de porcelanas.
 A Vista Alegre, de Aveiro, tinha então o monopólio da produção de porcelana em Portugal e o alvará da “Pouca Sorte” é um documento essencial para ser autorizado o arranque duma nova fábrica.
 O que viria acontecer depois de algumas lutas judiciais. Um parecer do Professor de Direito Marcelo Caetano – que mais tarde viria a ser Primeiro-Ministro de Portugal - tornar-se-ia decisivo para o nascimento da SPAL, cuja construção chegou a ser iniciada à Ponte de Jardim, num terreno da Família Navalhão, local onde hoje funcionam armazéns da Cooperfrutas.
Há 2 nomes da primeira Administração da SPAL –Joaquim da Bernarda e Mário Tanqueiro – que têm um papel fundamental na contratação de pessoal especializado do ramo das porcelanas da região de Aveiro e Coimbra. O primeiro Diretor de Fabrico, Corte de Real de seu nome, vem da SP-Coimbra, e é um importante “trunfo” na aproximação dos principais armazenistas portuguesas à nova Fábrica, que cometia o “sacrilégio” de afrontar a “sagrada” e conceituada Vista Alegre. Mais tarde junta-se à Administração da SPAL Oliva Monteiro, vindo de Moçambique, que veio a ser a trave-mestra na gestão da nova Fábrica construída em Ponte da Torre-Valado dos Frades.
O primeiro grande cliente é a Lever Portuguesa que compra 6 milhões de peças de um modelo, de nome “Girassol”, e que terá ajudado - e muito - a pagar o investimento inicial da nova fábrica.
Pouco anos depois do seu arranque a SPAL foi a primeira Empresa de cerâmica a lançar um concurso de design (1970), que teve no júri uma figura pública com a craveira de José Augusto França.
 Concorreram 16 designers tendo o primeiro lugar sido atribuído a Daciano Costa, então quase um ilustre desconhecido, e que anos mais tarde foi Professor convidado do departamento de arquitectura da Escola Superior de Belas Artes de Lisboa. 
O 2º.prémio foi atribuído à finlandesa Miria Toivola. Como curiosidade referimos que o último classificado foi um par de presidiários da Colónia Penal de Alcoentre, que conseguiram duas ou 3 viagens à Fábrica, com a respetiva escolta, para arejar e também para apresentarem os seus desenhos de um serviço de mesa que tinha uma decoração que parecia vista através de um buraco de uma fechadura…
A Administração não descura o bem estar e a segurança dos seus operários e cria um Fundo de Pensões e a COOPSPAL -Cooperativa de Consumo.
Seguiram-se anos de ouro com uma procura superior à produção da Fábrica, que chegou a produzir 100.000 peças dia. Conquistado o mercado local seguiu-se a exportação. Um agente na Suécia – Bo Brandt – e outro no mercado americano – Block China – projectam a SPAL para outros mundos.
A crise da década da 80, que levou à primeira passagem do FMI por terras lusitanas, passa ao lado da Fábrica da Ponte da Torre.
Foi um ciclo de vida dourado da SPAL no seu primeiro tempo de vida.

 Em 2010 com novos proprietários a SPAL inicia uma segunda vida, que – entre várias mais-valias - mantém 470 postos de trabalho.

JERO

sábado, 12 de abril de 2014

M - 471 AS VOLTAS QUE A VIDA DÁ !

As voltas que a vida dá !

Quando saímos de Binta, no norte da Guiné, tivemos direito a lágrimas de saudade dos que ficaram.
Tínhamos sido importantes para eles e para nós próprios .

O último ano em Binta aconteceu
 n’outro mundo! Quase que tínhamos esquecido o mundo para onde regressámos em Maio de 1966!
Quando regressámos à Metrópole e à vida civil
 chocámos com um mundo onde a nossa importância anterior rapidamente se esbateu.
Já estava
 tudo feito - éramos apenas um pequeno parafuso de uma máquina gigantesca que girava sem cessar – e à nossa volta já não tínhamos a malta da Companhia. Todos tinham partido para as suas vidas. Para longe.
Nos primeiros meses corríamos sempre há chamada de cada camarada que se casava. Viajávamos de norte a sul do País para nos voltarmos a encontrar.
Naquelas horas que estávamos juntos voltávamos lá! E o
 nosso Capitão normalmente estava por perto!
Depois tínhamos que voltar ao
 mundo dito normal , onde ninguém falava a nossa linguagem!
Que tempos amargos. Trabalho. Mais trabalho. E – falo por mim - solidão.
E os anos iam passando. Uma vez por ano a malta da Companhia reunia para um convívio, onde começámos a levar os filhos, que entretanto tinham chegado às nossas vidas. As estórias do nosso tempo da guerra voltavam inevitavelmente nesses dias especiais com velhas discussões em relação à emboscada de Caurbá, ou de Cansenhe, no caminho de Farim, ou perto de Guidage… E muitos anos depois havia camaradas que chegavam à conclusão que se tinham abrigado do fogo inimigo “à frente” de uma árvore e “não atrás”, como conviria…
Todos esses convívios anuais começavam com uma missa onde eram recordados os camaradas que “tinham ficado” na Guiné e os que entretanto, pela lei da vida, nos tinham já deixado. Dos 170 que tinham pertencido inicialmente à CCaç. 675 já não estavam entre nós cerca de quarenta!
E quando os “cabelos brancos” chegaram uma “comissão de camaradas de boa vontade” passou a reunir-se uma ou duas vezes por ano para visitar as campas dos camaradas que já tinham partido para honrar a sua memória e deixar na “última morada” uma lápide com o seu nome e com o emblema da Companhia.
O tempo passa depressa, muito depressa, e, felizmente, que a “idade do condor” trás também algumas coisas boas. Um camarada e sua dama chegam às Bodas de Ouro” e convidam a malta da Companhia para estar presente.
 E vamos à Missa de acção de 
graças e ao Copo de Água para aconchegar os estômagos e a “memória do casamento”. 
Tudo a rigor e com uma programa festivo que nos dá a conhecer uma família numerosa que canta e dança em volta dos “noivos”, rodeados de filhos, genros, netos e netas. 
Um autêntico espanto.
Estávamos a saborear o prato de peixe – bacalhau com broa – quando um grito numa mesa próxima me fez quase saltar da cadeira. Porque o grito de aflição tinha o meu nome: “Oliveira”.Dirige-me à mesa onde estava o Rodrigues, correspondendo ao apelo da mulher do Cravino, que via ainda em mim o enfermeiro que eu tinha sido na vida militar cinquenta anos atrás.
O Rodrigues, que eu sabia, que estava a meio de um tratamento
oncológico, estava muito pálido, espumava pela boca e tinha cabeça pendida para o peito. Não dava acordo de si e quando lhe peguei no braço para “ver” as pulsações não lhe encontrei o pulso. Olhei de novo para a cara e o seu aspecto era assustador. A fazer pensar o pior. 

Felizmente aproximou-se um jovem, que era enfermeiro a sério e “dentro do prazo”, que deu uma ajuda. Dois ou três minutos depois o Rodrigues voltou a si.

A côr voltou-lhe a face e falou com a mulher e comigo sem se lembrar que tinha estado alguns minutos em colapso. Na fase mais preocupante tínhamos pedido que se chamasse o INEM. O Rodrigues recusou de imediato a ideia e como parecia estar de facto melhor anulou-se a “urgência”.
 Passado mais uns minutos levantou-se e dirigiu-se para fora do restaurante, pedindo para ir para o seu carro e voltar para casa. O filho estava por perto e sentou-se ao volante. Momentos antes tinha sabido que o Sporting do meu amigo Rodrigues estava a ganhar por 2 a zero ao Paços de Ferreira. Nunca antes que me lembre – sou benfiquista desde os bancos da escola – tive tanta satisfação em dizer a um camarada “em azar” que os “lagartos estavam a ganhar ao intervalo. E o seu sorriso de satisfação valeu a pena e tornou mais leve o “meu sacrifício”…
Entre o grito da mulher do Cravino e a entrada do Rodrigues no seu carro para regressar a casa com a sua mulher e filho, decorreu cerca de meia hora. O meu prato de bacalhau há muito que tinha arrefecido e já não o comi. Enquanto andei “armado” em enfermeiro não pude deixar de reparar que a maioria dos convidados das “bodas de ouro” não perdeu o apetite e fez as honras ao prato de peixe do “copo de água”…sem interromper uma garfada que fosse!
Depois a festa continuou com os familiares dos “noivos” a cumprirem um animado e bem pensado programa em honra da Luísa e do Carlos, que tinham contraído património há cinquenta anos atrás em 5 de Abril de 1964 na Basílica da Estrela.

 Um mês e pouco depois –em 8 de Maio – o Carlos embarcou para a Guiné, integrado na Companhia de Caçadores 675.
Quando então saímos do cais da Rocha de Conde de Óbidos, em Lisboa, tivemos direito a lágrimas de saudade dos que ficaram.
Recriámos esse tempo de despedida na noite do “encontro” dos eternos namorados de há 50 anos nas Bodas de Ouro de 5 de Abril de 2014. 
Meio século depois de Binta numa época em que o vagomestre nos ”matava a fome” com “ciclistas”(feijão frade presente em todas as refeições). 
Que recordo com um sorriso.
 O que, sinceramente, a partir de agora não vai acontecer quando me apresentarem “bacalhau com broa”.
Ao almoço ou ao jantar.
 Nem lhe vou tocar…

As voltas que a vida dá !


JERO







segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

M 470 UMA QUESTÃO DE CONTAS...

CARTA DE TRACTOR...

Esta história verídica teve como protagonista 

um indivíduo algo ingénuo do interior norte ( profundo) que evidenciava, nitidamente, um claro deficit de neurónios e que por isso mesmo nunca deveria ter sido sujeito a situações como as da vivência de uma guerra...


Teríamos uns 13, 14 meses de presença sofrida mas também pejada de situações roçando o estatuto de hilariantes e simultaneamente tristes como esta que ora vos conto...

Determinado soldado, casado,recebeu uma carta de casa onde o informavam de que iria ser pai...

Irradiando uma satisfação do tamanho do mundo ,o soldado em questão, sorriso rasgado de orelha a orelha, mostrou a missiva a um dos seus amigos mais chegados...

-Vês,pá... Vou ser pai!


Só peço a deus que me deixe chegar são e salvo à terra p`ra conhecer o meu filho que está para chegar...

-Como ?
Olha lá pá, retorquiu-lhe o amigo...
Com quantos meses de gravidez está a tua mulher ?

-Sei lá !

Falando para os seus botões, o amigo murmurava...

-Como hei-de dizer a este pobre, a este caramelo, que o filho não é dele?

- Tu sabes há quantos meses estamos na guiné ?

-Isso sei !

"Cheguemos" no dia de santo antónio... Depois disso já beio o natal e outro santo antónio... Ora deixa cá ver, são...

-São mais de treze meses, pá...
Então como é que é possível essa gravidez vir de ti...
Sabes quantos meses tem ela de barriga?
Tu não vês que a gravidez demora apenas nove meses e tu já cá estás vai para catorze sem ir a casa ...

-Sei lá! Eu disso de meses num percebo nada !

-Olha que essa mulher não serve p`ra ti, pá...

-Num serbe proquê ?

-Se ela gostasse de ti não te tinha feito o que fez...

-Que é que ela fez?
Ela fez, ela fez...quem fez foi a irmã dela...

-A irmã dela? A tua cunhada? Já não estou a perceber nada...

Foi assim: eu andava enrabiscado com a irmã dela, mas a gaja meteu-se com um tipo lá da terra ...
Quando fui no domingo de páscoa a namorar, ela tinha fugido c`o tal gajo...

- E quem foi que te contou?

- Foi a que agora é minha mulher...
Disse-me : olha, a minha irmã, pôs-tos...

-Ela quê ? Ela quê ?

-Deixa lá rapaz, deixa lá que tu não merecias isso...
Se tu quiseres posso fazer as vezes dela...

-Se ela quis ir embora, pois boa biaje...

"Comecemos" a namoriscar os dois ambos e "casemos" quinze dias antes de eu bir p`ra cá...



Foi assim a modos que uma bingança contra a irmã.
Casei-me cum esta que é mais belha ...

-Que idade tem ela?

Num sei bem mas tem uns trinta e tal...

Mas num fiquei a perder pois tem carta de tractor...


Manuel Maia

sábado, 25 de janeiro de 2014

M - 469 CROMOS DA VIDA

AMOLADOR DE FACAS E TESOURAS 


À distância no tempo recordo o som da “gaita do amolador” e “vejo” o homem e a sua bicicleta a descer a minha rua.
Associo ainda a esta memória a chegada do Inverno pois além de amolarem facas e tesouras consertavam chapéus de chuva.
 E, quando havia clientes para tal, punham agrafes em pratos e alguidares.
Em meados da década de sessenta  - depois de se fazerem ouvir - paravam para trabalhar junto à esquina do Cinema de Alcobaça, na Rua Afonso de Albuquerque.
 Eram dois homens relativamente novos, originários de Valado de Frades.
 O da fotografia – que consegui mais uma vez graças ao espólio fotográfico da “Taverna do Capador” – e um outro bastante mais alto.
 Nomes ?
 Apesar de muitas tentativas não o consegui. Talvez algum leitor se lembre e me dê uma ajuda.
É uma profissão que se tem vindo a perder ao longo dos tempos.
Mas perdura a memória do som das suas “gaitas de amoladores”:

"FFFIUUUUUUUUUUIIIII.... FFFIIIIIUUUIIUUUU!" 
 "É o amolador! Afia facas e tesouras e concerta sombrinhas!"



JERO

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

M - 468 UMA CHAMADA A HORAS MORTAS...

Uma “chamada” com que ninguém contava…
 Saber lidar com a morte é algo difícil para a maioria das pessoas. Nessas horas o sentimento de dor e desespero pela perda é muito difícil de ultrapassar pelos familiares e amigos próximos.
Mas depois há as profissões que convivem de perto com a morte.
 Uma das profissões em que isso acontece – quase sempre em condições dramáticas - é a do perito legista. Trabalhando no Instituto Médico Legal esses profissionais, na maioria das vezes, realizam perícias de mortes trágicas, que envolvem acidentes ou assassinatos.
Há ainda o caso dos coveiros que precisam trabalhar perante o sofrimento e a dor dos familiares do ente querido que vai a enterrar.
Mas ainda antes do acto de sepultar os mortos, existe o serviço das funerárias , onde os seus funcionários, normalmente conhecido por cangalheiros, preparam o corpo para a última viagem.  Vestem, fazem maquiagem, cortam o cabelo, fazem a barba, colocam flores no caixão, para que fique uma boa impressão do falecido durante o velório. Para que um corpo fique pronto gastam-se largos minutos. Quando não são horas.
Feito o contexto do tema que hoje abordamos vamos ficar por “estórias” que constam acerca de alguns velórios.
 Desde a daquele homem do campo, cujo caixão foi transportado durante alguns quilómetros em cima de um burro até à Igreja, e que caiu tantas vezes durante o percurso que, durante o velório, abriu os olhos e voltou  (momentaneamente) à vida...assustando toda a gente.
Ou a de um pescador já idoso, que no velório na capela da sua naturalidade, “acordou” e se levantou por momentos do caixão onde repousava, sujeitando-se de imediato a um ralhete da sua (assumida) viúva, que rapidamente o aconselhou a deitar-se de novo pois as despesas do funeral já estavam feitas…
A última é dos nossos dias e aconteceu durante o velório numa capela duma igreja duma aldeia do Litoral Oeste.
Na preparação do corpo para o funeral o cangalheiro, que trabalhava sozinho, reparou que o casaco do morto era do mesmo padrão e cor do que trazia vestido, mas com uma diferença. Era novo e o seu …nem por isso. E quanto a tamanho? Eram iguais. O cangalheiro pensou em voz alta (ou teria sido em voz baixa…) que o morto não se ia importar e fez a troca.
Seguiu-se o velório. As horas foram passando e, como é habitual, com o decorrer do tempo as condolências foram escasseando e na capela mortuária ficaram os familiares mais próximos e dois ou três amigos indefectíveis. E o cangalheiro.
Perto da meia-noite tocou um telemóvel. Uma, duas, três, quatro vezes e mais vezes. Ninguém atendia. Os presentes olhavam uns para os outros mas o som do telemóvel parecia cada vez mais estridente no silêncio da noite que já ia longa.
Mas o mais estranho de tudo era que o som do telemóvel parecia vir de dentro do caixão…
O longo minuto terminou quando o cangalheiro bateu com a mão na própria cabeça e foi “ajeitar o corpo” no caixão. O som do telemóvel deixou se ouvir.
Vá se lá saber porquê!!!
Quem é que ia esperar uma “chamada” a horas mortas…
JERO



quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

M - 467 O CAFEZINHO (PAI)

CROMOS DA VIDA

Só não erra quem não faz nada e no nº.3 da nossa “colecção” de CROMOS da VIDA chamámos ao protagonista “José”, quando devíamos ter chamado Joaquim Miguel, por alcunha o “Cafezinho”. 
A chamada de atenção para o nosso erro foi-nos feita por um seu enteado – de nome João Gomes Félix que, por acaso, foi nosso companheiro de escola nos velhos tempos da Adães Bermudes - .
A alcunha do “Cafezinho” ganhou-a quando foi preso por contrabandear café durante a guerra civil espanhola, o que já tínhamos referido na crónica anterior, mas ficámos a saber que a pena que cumpriu na Cadeia de Alcobaça foi de (longos) 27 meses. 
Era então carcereiro o João Machaqueiro.
 O “Cafezinho” era um detido bem comportado e da máxima confiança do carcereiro, fazendo com alguma frequência serviços no exterior de transporte de lixo sem qualquer guarda à vista.
 Numas férias do João Machaqueiro – na falta dum carcereiro substituto – foi o “Cafezinho”, com o conhecimento dum Oficial de Justiça do Tribunal de Alcobaça que ficou a tomar conta da cadeia, sem se ter registado qualquer problema de monta.

 Só um pequeno barril de vinho, propriedade do carcereiro, terá descido alguma coisa no seu nível, eventualmente com a ajuda de algumas libações do Joaquim Miguel…
Este adicional à pequena estória do “Cafezinho” Pai só prova que somos um povo de brandos costumes. 
Um preso – na ausência do carcereiro - a tomar conta da Cadeia por alguns dias marca, sem dúvida, um tempo e um povo.

JERO





quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

M - 466 CROMOS DA VIDA

O Manjerico 

A primeira recordação que retenho na minha memória acerca do “Manjerico” – um homem de pequena estatura, um pouco curvado e sempre arrimado a um cajado – data do início dos anos 50.
 De seu nome Aníbal Campos nasceu por volta dos anos 20, devendo a sua alcunha ao padrasto de sua avó, de Turquel.
O “Manjerico” morava para os lados da Guarita – numa das saídas da Vila para as Caldas da Rainha e era guardador de gado (cabras e ovelhas) , razão porque andava sempre com o seu cajado.
 Era homem de poucas palavras, falando quase que só por monossílabos. Era uma pessoa pacífica que vivia para o seu trabalho. 
Impressionava o seu eremitismo, a começar pelo lugar isolado onde morava .
 A Guarita em causa situava-se na antiga Cerca do Mosteiro, para os lados da Fonte Nova. 
Nunca constituiu família sendo tratado - quando em certa altura da sua vida esteve bastante doente - por uma cunhada.
Na sua vida pacata foi notícia por causa duma aparatosa queda que sofreu numa boleia na mota do Luís Capador (Pai do actual proprietário da taverna do mesmo nome).
 O Capador (Pai) “apanhou-o” em Évora de Alcobaça para o levar até à Benedita.
 Quando chegou ao seu destino e convidou o “Manjerico” para se apear não tinha o “pendura”.
 Voltou para trás e veio a encontrar o “Manjerico” em Évora. Tinha caído logo na altura do arranque da potente mota e em vez de chegar à Benedita só viu foi “estrelas”, devido à violenta queda que sofreu.
 “Estava escrito” que se dava mal com viaturas de 2 e 4 rodas e, no ano de 1979, veio a ser vitima de um atropelamento numa passadeira de peões, junto ao Parque de Campismo, que lhe custou a vida.
Teria então cerca de 60 anos de idade.
A fotografia com que o recordamos faz parte do espólio do “núcleo museológico” da Taverna do Capador, em Alcobaça. 
Quem o conheceu não vai ter dúvidas.
 É mesmo o “Manjerico”.

JERO