terça-feira, 29 de novembro de 2011

M - 387 FADISTAS CHORAI, CHORAI...

Fado, Património Cultural Imaterial da Humanidade

1. No dia em que foi aprovada a candidatura portuguesa do Fado à Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade,veio-me de imediato à memória o alcobacense Olegário José do Nascimento, falecido tragicamente num acidente de viação no dia 14 do mês de Agosto de 2009.
À sua maneira o nosso querido e saudoso Olegário do Nascimento, o “Galhito”(como também era tratado por familiares e amigos) foi o melhor fadista alcobacense de todos os tempos.
No texto que lhe dedicámos a quando do seu falecimento, publicado em O ALCOA em 27 de Agosto de 2009 referimos então:
«Nos bons velhos tempos de solista da Orquestra Típica de Alcobaça (juntamente com o seu irmão Valdemar) na regência do Maestro António Gavino acumulou sucessos .Seguiu-se a sua fase fadista com múltiplas apresentações e outros tantos êxitos pessoais sem as devidas compensações materiais. Faltou-lhe então um “golpe de asa” e uma mão amiga para lhe “abrir” as portas certas do mundo do fado. Com o seu modo desprendido e pouco “interesseiro”, que o caracterizava, o “Galhito” também não terá lutado o que devia e terá passado ao lado de uma grande carreira de fadista. Depois emigrou por longos anos para a Alemanha, onde trabalhou duramente e…não fez fortuna.Quando regressou…dedicou-se a outras vidas. Era um homem íntegro, amigo do seu amigo, que não nasceu para ser rico. Contentava-se com pouco e viveu à sua maneira.»

A outra pessoa de que me lembrei, felizmente ainda vivo e bem vivo,foi de um amigo de Monte Real(no nosso distrito de Leiria), que tive o privilégio de conhecer através de um blogue de ex-combatentes da Guiné (Luís Graça & Camaradas da Guiné).
Trata-se de Joaquim Mexia Alves, o principal mentor e responsável pela Tabanca do Centro, criador e intérprete do “Fado da Guiné”.


Em homenagem ao Galhito e manifestação de apreço ao Joaquim reproduzimos seguidamente a letra do seu fado, tantas vezes cantada nos seus tempos de militar (ex-Alf Mil Op Esp/RANGER da CART 3492, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73



Fado da Guiné
Letra (original): © Joaquim Mexia Alves (2007)
Música: Pedro Rodrigues (Fado Primavera)


Lembras-te bem daquele dia
Enquanto o barco partia
E tu morrias no cais.
Braço dado com a morte,
Enfrentavas tua sorte,
Abafando os teus ais.
(bis)
Dobrado o Equador,
Ficou para trás o amor
Que então em ti vivia.
Da vida tens outra margem
Onde o medo é coragem
E a noite se quer dia.
(bis)
Aqui estás mais uma vez,
Forte, leal, português,
Sempre de cabeça erguida.
Não te deixas esquecer,
Nem aos que viste morrer
Nessa guerra em tempos ida.
(bis)
Que o suor do teu valor
Que vai abafando a dor
Que te faz manter de pé,
Seja massa e fermento
Desse nobre sentimento
Que nutres pela Guiné.
(bis)

Joaquim Mexia Alves
Monte Real,18 de Agosto de 2007


Em homengem ao "Galhito" e manifestação de apreço ao Joaquim.
29 de Novembro de 2011
JERO

domingo, 27 de novembro de 2011

M - 386 VEM AÍ O FERIADO DO 1º. DE DEZEMBRO

RESTAURAÇÃO de valores

Aproxima-se o dia 1 de Dezembro,que é feriado nacional.
Pela experiência de vida que acumulei ao longo do tempo tenho a convicção que muita gente – principalmente das camadas mais jovens - vai “curtir” este feriado sem saber o “porquê” do chamado dia da Independência ou da Restauração.
Eis algumas das respostas de pré-universitários com 18 e 19 anos de idade que questionei à entrada de uma grande superfície.
- 1º.de Dezembro é o “Dia dos Reis Magos”!
- Foi a implantação da República!
O que se passou em 1640? «Não faço ideia.»
Os 40 conspiradores? A defenestração do traídor Miguel de Vasconcelos?
«Não faço a mínima.»
O domínio dos Filipes? Quantos anos?
- Sei lá. Sei que foram três dinastias !
A Restauração da Independência? Quem foi o primeiro Rei da IV Dinastia?
«Não faço a mínima ideia.»
À distância no tempo – quando em 1950 fiz o meu exame da 4ª. classe (hoje 4º. Ano) – sabíamos isto tudo, que agora recordo sem necessidade de consultar a Wikipédia, porque além do conhecimentos de história eram transmitidos - com a propósito - ideia de valores: a coragem, a bravura, o patriotismo, a Pátria.
Havia em fundo uma componente política – leia-se “Mocidade Portuguesa” – de que recordo essencialmente a parte desportiva e “turística”, com os jogos de voleibol e com as viagens às Caldas da Rainha, a Torres Vedras e à capital. A viagem a Lisboa era então o “limite”, com a visita ao Jamor e ao Estádio Nacional.
Esta fase competitiva da Mocidade Portuguesa - com a possibilidade de ir até ao Estádio Nacional - já nos apanhava com mais de 13 anos. mais próximos de comissários políticos, que víamos essencialmente como treinadores desportivos.
Mas o “ponto” que hoje queremos aqui deixar tem a ver com a restauração de valores - e de saberes – num tempo que é essencialmente de corrida ao consumo numa vida agitada, de luta, de competição.
Que começa nos pais e se transmite aos filhos.
Quinta feira da próxima semana é feriado .
Dia da Restauração da Independência.

Vou “perder” algum tempo com os meus netos e falar-lhes do que se passou no dia 1º. De Dezembro de 1640.
E fazer-lhes notar que essa resposta do «não faço a mínima» não é nada abonatória para quem a profere.
Tenho de aproveitar esta oportunidade dado que no próximo ano o 1º. de Dezembro já não deverá ser feriado, esperando no entanto que a nossa independência se mantenha.

 

A possível (dentro da conjuntura) obviamente.
JERO





quinta-feira, 24 de novembro de 2011

M - 385 E VÃO TREZE...

RESCALDO DA XIII MOSTRA INTERNACIONAL DE DOCES E LICORES

Estivemos os 4 dias da Mostra deste ano na Sala do Capítulo perto dos doces e “dentro” dos licores.
Foi uma experiência gratificante, diferente e difícil de repetir pois não é fácil aguentar diariamente mais de 10 horas de pé. Refiro-me a um “rapaz” que fez 4 anos em 4.04.1944 e que, por acaso, sou eu próprio.
Estive num stand dos licores .
 Mais propriamente no espaço da MLC – Licores Conventuais (Alcobaça). Os vizinhos eram o Restaurante Trindade (Alcobaça), a Pastelaria Pão de Mel (Alcobaça), os Doces do Convento (Arouca), o Quintal D. Quixote – Francisca Rasga (Évora), a Padaria do Marquês (Leiria), a Pastelaria O Mosteiro (Lorvão), as Maltesinhas – Francisca Casteleiro (Beja), a Casa do Bolinhol - Kibom (Vizela), o Pão-de-Ló Flôr-de-Liz (Ovar) e A Casa da Isabel (Portimão).
Entrei como “vendedor” de livros e acabei como “auxiliar” na venda de licores.
Há sempre uma primeira vez e a experiência do “Capítulo” teve alguns momentos “eternos”, que resolvi partilhar.
Uma das bebidas do MLC chamava-se “amor eterno” e a explicação do “eterno” dava “pano para mangas” e teve momentos bem divertidos e o contrário…
Calhou-me a mim a “fava”.
Aproximou-se um jovem do meu tempo, de cabelos brancos, de rosto sério mas com ar vigoroso. Caminhava com “canadianas” ,e como em passado recente também tinha andado com “elas”, por causa de uma operação ao menisco, meti conversa perguntando se o seu joelho também já tinha passado do prazo.
A resposta desconcertou-me e fez-me engolir em seco. Tinha sido Chefe da Polícia e na perseguição a um larápio tinha tido um acidente grave, que tinha obrigado à amputação de uma perna.
Esse momento aziago alterou-lhe a partir de então a sua vida. E as dos seus familiares mais próximos.
As “canadianas” eram para o resto da vida. Eram “eternas”.
Os visitantes dos dois primeiros dias da mostra – 5ª. e 6ª. feira – eram bem diferentes dos do fim de semana. Principalmente na quantidade e no poder de compra. Eram poucos e com as mãos nos bolsos…
Uma jovem que vendia no stand do “Pão de Mel” classificava-os como “mirandam”. Miram e andam. Compras …nem vê-las.
Foi um tempo em que deu para conhecer os vizinhos. Conversa agradável e troca de “mimos”: bolos por licores e licores por bolos.
A grande surpresa foi encontrar na venda de pão de ló de Ovar uma médica, em regime de voluntariado. E estava ali para fazer o favor a uma amiga do casal de Ovar, que não tinha conseguido vir no primeiro dia.
 E que a médica-voluntária nem conhecia.
Assumia o papel de vendedora com o maior dos à-vontades e só estava aborrecida por ter tão poucos clientes.
Chegou o sábado e a “cheia”.Mais de 20.000 visitantes.E no domingo outros tantos ou mais.


De invulgar algumas visitas em grupo de turistas japoneses que, sempre em andamento, tiravam fotografias aos bolos…e não paravam.
Qual o gozo?
Quem ficou de olhos em bico fui eu
Mas houve uma excepção. Passou um grupo e uma japonesa ficou para trás (qual kamikaze) e provou um licor de ginja.


À borla …mas provou. Não disse uma palavra mas deu para perceber que gostou.


Aliás nesta área dos licores deu para entender que há muita “gosma”.
Não a respeitante à expectoração mas mais do tipo chupista e/ou borlista.


E vamos à ultima.
Na enchente de domingo à tarde à funcionária do “Pão de Mel” faltaram-lhe 40 cêntimos num troco, por falta de moedas na caixa. A cliente – uma senhora com “nariz arrebitado” – não perdoou e pediu um bocado de um bolo como compensação. Recebeu de imediato uma pequena “casca” de um bolo folhado. Não aceitou e disse que voltava mais tarde. E voltou.
E levou a troika, digo, o troco dos 40 cêntimos.
Se todos fossem tão rigorosos com os cêntimos…não tínhamos chegado quase à “banca rota”.
Mas apesar da crise estiveram em Alcobaça, na XIII mostra de Doces e Licores Conventuais mais de 45.000 visitantes que desfrutaram das delícias gastronómicas que “decoraram” os 37 expositores de representação nacional e internacional (Espanha, França e Bélgica).
Foi uma grande jornada para Alcobaça com a mais valia de ter honras de um directo da RTP, com cerca de 3 horas.

E eu estive lá.
Perto dos doces e “dentro” dos licores.


JERO
Na foto o "dono" dos licores abaciais Carlos Gomes, o escritor Luís Rosa e o homem da ressaca, digo, do rescaldo dos doces e licores,JERO.






sexta-feira, 4 de novembro de 2011

M 384 GEORGE

UM AMIGO CHAMADO GEORGE
A tarde de Outono, com temperaturas ainda a recordar o Verão, que o calendário já tinha transposto, convidava ao sossego e a “carregar baterias”.Na esplanada do “Parque dos Monges” estava-se bem…
Lia a revista do Expresso – passe a publicidade – quando a conversa da mesa ao lado me começou a fazer a olhar para as páginas sem as ler.
O tom de voz do casal que falava com um homem que parecia já andar por volta dos 70 era perfeitamente audível, percebendo-se pelas respostas do interlocutor aparentemente mais velho, que este era emigrado. O seu português tinha algumas deficiências na conjugação dos verbos e algumas expressões do tipo “yaa” ou “yes”davam para entender que devia ser um português já com muitos anos de “americano” ou “canadiano”.
Na sua vida tinha já mais anos fora de Portugal do que “dentro” mas, apesar de tudo, conseguia ultrapassar todas as dificuldades para vir passar umas duas ou três semanas na terra onde tinha as suas raízes. Vinha sozinho e cumpria religiosamente uma rotina que desde há muito impunha a si próprio. Ia à missa e depois ia visitar os seus pais no dia de “Todos os Santos”, para pôr flores nas suas campas e “falar com eles”. E ao longo dos anos a pergunta continuava a ser a mesma.
 «Porquê ?».
Não o referiu expressamente mas deu para entender que os seus pais, trinta e tal anos antes .tinham decidido a sua vida sem lhe pedirem opinião. Já estava casado e com dois filhos pequenos e um dia entregaram-lhe “papéis” para imigrar, “papéis” esses que tinham sido tratados à sua revelia.
As razões? Para bem de todos era melhor sair de casa, pois os tempos estavam maus e emigrar "é que estava a dar”.
Emigrou “à força” e durante os primeiros anos comeu “o pão que o Diabo amassou”.
Lavou pratos , milhares de pratos, e durante um largo período da sua vida ficou ligado à restauração.
A sua mulher e os dois filhos portugueses juntaram-se-lhe e a família aumentou com um nascimento de mais um rapaz já no “seu” novo País.
Os anos passaram e chegaram netos.
Mudou de “carreira” e nos últimos anos tem uma vida financeiramente mais equilibrada mas que obrigou a alguns sacrifícios em termos familiares.
 A família está mais longe.
Perto , fisicamente, só a sua mulher com quem não fala muito.E vice versa...
 Não é só o tempo por lá que é frio…
Nessa tarde de Outono, com temperaturas ainda a recordar o Verão, falava com particular entusiasmo do George, um amigo especial.

Só passado um bocado percebi que era um cão!

Os meus vizinhos de esplanada levantaram-se e saíram.
Fiquei mais um bocado e pousei a revista do “Expresso”.
 As árvores sem folhas reflectiam-se no céu.

O “porquê” amargurado do “emigrante à força” ainda estava bem presente no silêncio que me rodeava.
Como devia ser importante para ele, nesta fase da sua vida, o George!
De quem comecei a gostar a partir daquele momento.
Porquê?
 Porque…afinal ainda não tenho as pilhas carregadas…
Vou ter de ficar por aqui.


JERO

Hello, George!