quinta-feira, 31 de março de 2011

M 348 - TURISMO D'OUTROS TEMPOS

Alcobaça e o Congresso de Turismo de 1911


Por iniciativa da Sociedade de Propaganda Nacional realizou-se em Lisboa a 4ª edição do Congresso de Turismo no mês de Maio de 1911, iniciativa que recebeu 1500 congressistas. O poder republicano desejoso de reconhecimento e de visibilidade internacional e ciente da necessidade de atracção de divisas vai, finalmente, dotar o país de estruturas orgânicas para o fomento turístico, instituindo um Conselho e uma Repartição do Turismo.


O turismo passa a ser entendido como uma indústria em que se depositam grandes esperanças. A Sociedade de Propaganda Nacional realça as potencialidades turísticas de Portugal, criticando, todavia, a falta de visão e de iniciativa na exploração de um filão intacto e inesgotável:


“a apregoada situação geográfica do Cais da Europa…; as prodigiosas e tantas vezes enaltecidas condições climatéricas que nos podem converter na estação de inverno e no sanatório da Europa e da América; as belezas naturais que são toda uma paisagem orquestral de luz, de colorido, de fecundidade e de encanto; as termas e praias, as cidades e as vilas, os montes e os rios e até o carácter bondosamente hospitaleiro duma população diligente, afectuosa e simples, tudo isso, que constitui um património valiosíssimo que uma rudimentar noção de economia ensina hoje a valorizar, é como se fosse res nulius para nós, é, como uma campa da nossa inércia…. É tudo isso, enquanto as outras nações senhoras de um património bem menos valioso do que o nosso tratam, por todas as formas, de o fazer render pelo turismo, explorando afinal essas duas singelas necessidades humanas e universais de distracção e de descanso…” (Diário da Câmara dos Deputados, 8/01/1912).


O Congresso de Turismo numa missão de propaganda sobre as mais-valias do território patrocinou itinerários de visita. No periódico Leiria Ilustrada faz-se referência à visitação de uma embaixada de cem congressistas às terras de Alcobaça, Batalha, Leiria e Caldas da Rainha.


Na chegada a Alcobaça a ampla comitiva era efusivamente aguardada por centenas de pessoas na praça do município. A fanfarra que abrilhantava a recepção tocava no coreto os hinos de França, de Espanha, de Inglaterra, da Bélgica e de Portugal.


A visita ao Mosteiro foi seguida de um almoço na Sala do Capítulo. A fanfarra que acompanhou o repasto permitiu que, entre os pratos, os convivas pudessem dançar com as senhoras alcobacenses. A notícia destaca os vinhos ofertados pelo lavrador e governador civil José Eduardo Raposo de Magalhães, assim como os doces, mencionando as queijadas do Bárrio, o pão-de-ló de Alfeizerão e o arroz doce de Alcobaça (doce, aliás comum nas refeições monásticas). A generosidade dos congressistas materializou-se numa colecta endereçada ao Hospital da vila.


António Valério Maduro







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quarta-feira, 30 de março de 2011

M 347 - OFICIALMENTE EM ESTADO DE ABANDONO...

NASCIDO P’RA VIDA TEMPORARIAMENTE



António tem actualmente quase 2 anos e meio. Desde que nasceu p’ra vida aconteceram-lhe muitas e variadas coisas.
 Até aos 9 meses de idade só coisas más. Muito más.
Com o seu pai ausente a mãe deu-lhe um colchão sujo, sem lençóis e com apenas uma coberta.
 Na noite do seu quarto a luz eléctrica chegava timidamente através de uma extensão ligada na habitação de uma vizinha.
No quintal de sua casa era acesa uma fogueira que aquecia água numa panela assente em dois tijolos.
Por vezes a sua mãe deslocava-se num ciclomotor pelos caminhos térreos da aldeia. O António chorava ao seu colo.
 E chorava em casa…onde raramente tinha colo.
Na sequência destes e doutros factos que chegaram ao conhecimento da Segurança Social foi levado para um Centro de Acolhimento Temporário. Faltavam-lhe uns dias para os 10 meses de idade.
A adaptação inicial do António foi difícil.
Com hábitos de sono muito alterados chorava e era alimentado com dificuldade.
Com o decorrer dos dias acalmou e um mês depois parecia já outra criança.
Continuava pequenino mas mais nutrido…e tinha agora colo.
E o tempo passou.
Começou a andar quando já tinha mais de 15 meses.
 Aprendeu a falar tarde mas tornou-se uma criança muito simpática.
 Hoje, com quase 2 anos e meio, já se faz entender e anda na creche com outros meninos.
Oficialmente continua em estado de abandono.
 Porque os pais biológicos não aparecem no Centro de Acolhimento.
 Ou melhor, a mãe telefonou uma vez e visitou duas vezes o António. Nessas raras visitas o António rejeitou o seu colo. E chorou.
Recentemente o António teve na creche um desafio difícil.
No “Dia do Pai” todos os meninos fizeram um desenho.
O António também fez .
A única figura do seu desenho identificava uma figura masculina, parecida com o psicólogo do Centro do Acolhimento Temporário!
Segundo o psicólogo Eduardo Sá não há idades ideais para adoptar ou para rejeitar.
Mas o António precisa de uma família.
Afinal continua na vida temporariamente.
António é nome fictício.
Infelizmente os dados da sua história de vida não o são.
E passaram-se a poucos quilómetros da cidade de Alcobaça...

Mas algo nos diz que o Menino da nossa história irá ter uma mudança de vida .
Pra melhor.

Temos esperança que no próximo dia do Pai desenhe também uma Mãe...

E que no ano a seguir o novo desenho já "retrate"uma sala com brinquedos.
Com balões...e com um cãozinho, pequeno e brincalhão...seguindo os seus passos.

Afinal ...é só preciso aparecer uma família de adopção!

  JERO





segunda-feira, 28 de março de 2011

M 346 - VESTIRAM-SE DE POETAS OS SOLDADOS

1º.Congresso dos Combatentes do Ultramar

O artigo I do “regulamento” dizia que o Congresso realizar-se-á na cidade do Porto nos dias 1, 2 e 3 de Junho 1973.
O artigo II tinha várias alíneas e diversos considerandos. Os que mais me sensibilizaram tinham a ver com «…reatar e manter os laços de camaradagem…celebrar os serviços prestados e…procurar resolver os problemas relativos à integração social do combatente.»
Dia 3 de Junho de 1973
Eu estive lá. No Palácio de Cristal-Porto.


38 anos depois…o que retive.


Saí de Alcobaça acompanhado de minha mulher num Citroen de 2 cavalos, que ainda cheirava a novo. Fomos de véspera para estarmos no domingo no Palácio de Cristal. Ficámos num Hotel na baixa do Porto.

Na manhã do dia 3 seguimos para o Palácio de Cristal. Encontrei-me com o Rainho (Angola), com o Freitas (da Guiné) e com o Alves.
Quanto entrei naquele enorme espaço já encontrei uma multidão de ex-combatentes e vi na mesa de honra uma cara conhecida.
   Fiz questão de ir cumprimentar o Capitão José Caçorino Dias, que “conhecia” por interposta pessoa. Um seu irmão, que era a sua cara chapada e com quem tinha trabalhado na Sede do B.P. & S.M., em Lisboa .
Caçorino Dias era no meio militar uma figura mítica. Tinha ficado cego devido a uma mina em Angola mas mantinha um porte impressionante.
 Ao meio dia assistimos ao hastear da bandeira nacional.
 Seguiu-se a missa.
 Por volta da uma da tarde cantou-se o hino nacional. Guardo desse momento a lembrança mais forte.
 Uma recordação inesquecível.
O Hino. Um coro de mais de 10.000 ex-combatentes. Estávamos de pé junto às mesas .
 Cantámos a plenos pulmões. «Contra os canhões marchar, marchar…». Quando acabei de cantar senti uma emoção tremenda.
Fiquei silencioso. Julgo que por alguns minutos.
O almoço começou a ser servido.
 Os criados de mesa saiam em fila indiana de uma cozinha distante e iam servindo a sopa. Julgo que caldo verde.
Lembra-me do meu parceiro da frente, que devia estar cheio de fome, ter comido a primeira colher de sopa com uma mão e ter limpo as lágrimas que lhe corriam cara abaixo com a outra mão.
 Nunca mais esqueci aquele gesto simultâneo de emoção e controle.
 Eu tive que esperar mais algum tempo até conseguir engolir a primeira colher de sopa. Tinha um nó na garganta que tive que engolir …antes da sopa.
Sempre que a pátria decreta, vem-nos de Deus o recado.
 Seguiu-se um convívio de que guardo uma memória confusa. A meio da tarde iniciei o regresso a casa. Que estava a mais de 200 kms.
- E Veste-se cada poeta, De soldado.*
No passagem por Coimbra um engano grave. Entrei em sentido contrário numa rua que pensei que desse acesso à ponte. Fui mandado parar por um agente da P.S.P.

«Como é que você faz uma coisas destas?».
Reconheci de imediato o meu erro e disse-lhe que conhecia mal Coimbra.
Vinha do Porto do Congresso dos Combatentes do Ultramar. Trazia na cabeça o meu “quico”do camuflado e conservava ainda na camisa o crachat identificativo do Congresso.
Ainda me lembro do sorriso cúmplice do polícia quando me mandou seguir em paz.
...Ele também tinha andado por lá.
Mas a cena das lágrimas é que nunca mais esqueci.
 Porquê? Não sei explicar.
Sob o signo do sangue todo o céu se descerra - Ó povo incessante, fardado, mal ferido!...
Uma mão para limpar as lágrimas silenciosa, que escorriam pela cara abaixo, e a outra para levar de imediato a boca, a colher de sopa .
Foi o Alves. Filho de um Sargento da GNR, que tinha cumprido serviço militar São Tomé e Príncipe. Durante 36 meses.
 É preciso adiar o enterro da terra, Ir ao centro do Sol de certezas vestido.
Eu estive lá. No Palácio de Cristal-Porto. Em 3 de Junho de 1973. Passaram quase 38 anos.
- A nossa geração... andou na guerra.
 Por isso perseguimos a paz .

JERO


*”Vestiram-se os poetas de soldados”, antologia seleccionada e prefaciada por Rodrigo Emílio, expressamente compilada para o 1º.Congresso Nacional dos Combatentes.





sábado, 26 de março de 2011

M 345 - IN MEMORIAM TARCÍSIO TRINDADE

TARCÍSIO VAZÃO DE CAMPOS E TRINDADE

Ao 25 de Abril de 1974 era Presidente da Câmara Tarcísio Trindade, que cumpria o seu quinto ano de mandato.
(tinha tomado posse em 1969).

 
Com “os novos ventos revolucionários a soprar fortemente” foi vítima de enxovalhos pessoais, nomeadamente ,no assalto aos Paços do Concelho “pelos representantes do povo e das novas forças democráticas”, que o expulsaram da cadeira do poder.
No período conturbado que se seguiu (1974-75) Tarcísio Trindade foi durante algum tempo o alvo preferido dos “pintores de parede”, uma nova “classe de artistas” que despontaram depois do 25 de Abril de 1974. “Tarcísio Fascista” apareceu inscrito em paredes de diversas ruas da vila.
Com a postura calma, que lhe era geralmente reconhecida , Tarcísio Trindade, levando o seu filho mais velho pela mão, passeava então pela vila de pincel na mão e, em plena luz do dia, ia apagando as pinturas com que o “homenageavam”. Foi então acusado de “só” ter essa coragem por levar o seu “filho de calções” como escudo humano!
Mas há ainda uma outra história.

 Uma noite o ex-Presidente da Câmara estacionou o seu carro frente ao Café Portugal, na Rua “das Lojas”.
 A viatura foi reconhecida por alguns “revolucionários” que manobraram os seus carros de maneira a que o carro de Tarcísio ficasse“emparedado” .
Quando saiu Tarcísio percebeu “a piada” e viu no passeio do lado contrário ao “Café Portugal” alguns mirones prontos “a gozar o prato”. Tarcísio entrou no seu carro e à custa de múltiplas manobras e de pequenos toques dos carros da frente e de trás conseguiu tirar o seu carro. Deu uma volta ao quarteirão e voltou ao “Café Portugal”. Alguns dos mirones ,que tinham preparado “a armadilha”, ainda por lá estavam. Pois Tarcísio, novamente à custa de múltiplas manobras voltou a estacionar o seu carro no local onde estava anteriormente. Estacionou, saiu do carro e foi para casa… a pé!
E estes factos passaram-se à noite e sem o filho “de calções” pela mão!
Estes “terríveis actos provocatórios”valeram-lhe depois algum tempo de prisão em Caxias.
Esta “memória” é para ficar por aqui.*

 Mas já com as “artes finais” do nosso livro concluídas fomos surpreendidos com a notícia do falecimento de Tarcísio Trindade. Em 15 de Março de 2011.
Complementámos a memória a seu respeito com mais algumas notas, que como alcobacense lhe devemos.
Um percurso de vida notável
Nascido em Alcobaça, em 11 de Setembro de 1931 – estava a poucos meses de completar 80 anos – era filho de comerciantes. Aqui fez o seu percurso escolar até entrar para a Faculdade de Direito, em Lisboa.
Interrompeu os estudos para cumprir o serviço militar obrigatório. Não reatou os seus estudos. Seguiu o negócio da família e foi antiquário em Alcobaça. Mais tarde foi também livreiro, bibliófilo e avaliador.
O Tratado de Confissom, impresso em Chaves em Agosto de 1489, foi descoberto em 1965 por Tarcísio Trindade. Pina Martins publicou-o em edição diplomática em 1973 com um estudo introdutório. Em 2003 foi objecto de uma edição semi-diplomática e de um estudo linguístico, a cargo de José Barbosa Machado.
O Tratado de Confissom, um dos primeiros livros impressos em língua portuguesa, é uma obra de cariz pastoral.

Escreveu entretanto um livro de poesia.”Os Meninos e as Quatro Estações”.
«O velho do realejo chamou os meninos
E tocou só para eles na despedida
O Largo do Inverno de António Vivaldi

Os meninos pararam na corida
E ficaram à espera
Da Primavera
Sempre meninos.»

Em Alcobaça, foi Vereador da Câmara Municipal e Presidente Comissão de Turismo no mandato de Horácio Junqueiro, e depois Presidente de Câmara de 7 de Fevereiro de 1969 a 18 de Julho de 1974. Foi Presidente de Direcção do Ginásio de Alcobaça (durante sete épocas) e dos Bombeiros .Pertenceu também aos corpos directivos da ADEPA (1980).
Foi Director e Editor do jornal O ALCOA de 29 de Fevereiro de 1964 a 26 de Dezembro de 1970 .Teve ainda o seu próprio jornal.Com o título de “Jornal de Alcobaça” editou 112 números, durante 4 anos e 2 meses.
Nas primeiras eleições depois de Abril de 74 foi eleito para presidente da Assembleia Municipal, com os votos da Aliança Democrática (AD).
Assumiu anos mais tarde funções de Provedor da Misericórdia em 1987, mantendo-se nesse cargo até 2010, ou seja, durante cerca de 23 anos. Foi Condecorado em 2003 pelo Presidente da República Jorge Sampaio.
Era casado com Ana Mafalda Oriol Pena de Campos e Trindade e pai de 4 filhos: Tarcísio, António, Bernardo e Sancha.
Ao seu lado teve na vida uma grande mulher. Morreu-lhe nos braços. Em paz.
JERO

* É uma das 30 hitórias do meu novo livro "ALCOBAÇA É COMIGO" em fase de impressão.

















quarta-feira, 23 de março de 2011

M 344 - TOMA LÁ CASTANHAS !

Alimentos que combatem doenças

Saiba qual a relação entre algumas doenças e os alimentos que podem ajudar no seu combate e prevenção .
Todos sabemos que a alimentação tem uma enorme importância na prevenção de diversas doenças. Alguns alimentos ajudam a combater o aparecimento de certas doenças. Saiba quais:
Depressão: alimentos como o arroz, massa, pão e cereais integrais têm alto teor de carboidratos e ajudam a regularizar os níveis do neurotransmissor serotonina (responsável pelo bem estar e pela boa disposição).


Envelhecimento:A castanha retarda o envelhecimento. Rica em selénio, mineral que actua sobre a fadiga e melhora o humor, é responsável por expulsar possíveis substâncias tóxicas, prolongando a vida.


Doenças psiquiátricas:Fígado, agrião, espinafre, brócolos, beterraba são fontes de ácido fólico, que além de ter uma acção antidepressiva, reduz o risco cardíaco e de doenças psiquiátricas.

Alzheimer: de acordo com pesquisadores, as pessoas que ingerem doses diárias de vitaminas e minerais reduzem as problabilidades de desenvolver esta doença.
Entre os nutrientes, os que parecem ter mais efeito no combate do Alzheimer são os antioxidantes, vitamina E, C, A, que ajudam no combate aos radicais livres. As suas principais fontes são: manteiga, leite, gema de ovo, fígado, espinafres, trigo, nozes, carnes, óleos vegetais, morango, laranja, tomate, agrião.


Doenças cardiovasculares: os principais factores de risco para desenvolver problemas do coração são hipertensão, colesterol e triglicérides elevados, entre outros. Vale a pena investir em hábitos alimentares que previnam o aparecimento destes factores de risco.


Azeite de oliva: as gorduras representam 33% do total da energia ingerida diariamente. Para uma alimentação saudável, seria essencial substituir o consumo de gorduras saturadas por monoinsaturadas, como é o caso do azeite. As últimas novidades nutricionais afirmam que o uso de azeite de oliva reduz o colesterol e ajuda a prevenir as doenças cardiovasculares. Isso devido ao seu alto teor de ácidos monoinsaturados. Além disso, numerosos pesquisadores, médicos e nutricionistas afirmam que o azeite de oliva é uma fonte rica em vitamina E, que protege contra o cancro e as doenças do coração.
Por ser extraído da fruta e especialmente rico em antioxidantes, retarda o processo de envelhecimento celular.
Pressão arterial:Os peixes são ricos em ómega 3 e ajudam a reduzir a pressão arterial, diminuem as taxas de triglicérides e colesterol no sangue. Outros alimentos como: nozes e castanhas também são fonte de ómega 3.
Stress crónico: a laranja promove um melhor funcionamento do sistema nervoso. É um óptimo relaxante muscular e ajuda a combater o stress e a prevenir o cansaço.
Calmante:A alface contém a lactucina e lactupicrina, encontradas principalmente nos talos das folhas, actuam como calmante.
Ansiedade:Peixes e frutos do mar diminuem o cansaço e a ansiedade, pois contêm zinco e selénio que agem directamente no cérebro.


Inês Menezes (IDADE MAIOR)
2011-03-23




segunda-feira, 21 de março de 2011

M 343 - RUI RASQUILHO OPINA

Seis relatos, seis espelhos

1-Votar, votar, votar, votar sempre mesmo que seja em branco. Os centenas de milhar de cidadãos que vieram protestar nas praças das cidades no dia 12 de Março não podem ficar pelo desespero individual feito em colectivo. Não gosto do adjectivo da congregação – à rasca – preferia que tivessem escolhido algo mais dinâmico – em luta - mas isto é o que menos interessa. Fundamental para a sobrevivência do protesto vai ser o voto. É este exercício cívico que mantém a democracia mesmo que o resultado seja frustrante. Todos os que participaram na acção de rua têm de juntar o seu voto ao dos outros cidadãos para não se tornarem egoístas ao virarem as costas ao mais importante acto cidadão de cada um de nós. É a razão do refrescar da administração democrática. Reflectir em conjunto via novas tecnologias será também um bom futuro, mais sólido e mais interventivo. Tive pena de não ver bandeiras da Europa e não vou agora elaborar qualquer tese sobre esta ausência de um projecto que transcendeu as fronteiras de um Estado membro da União Europeia, que tem de concertar com muitos outros os problemas da governança.


2-Brutal foi a natureza no Japão. Milhares de mortos e desaparecidos. Radiações nucleares à solta. Cidades tragadas pelo tsunami. Casas , aviões, navios, automóveis destruídos. Prejuízos humanos e materiais ainda por determinar. A maior economia da Ásia atacada ainda em escala desconhecida. Teve grau nove o abalo como dizem ter sido o de Lisboa em 1755. Comparar as imagens do Japão com as gravuras do de Lisboa deixa entender o que terá acontecido nas costas de Portugal, Marrocos e Galiza devido ao tsunami. No século XVIII assustador é um pequeno adjectivo para o perigo nuclear cujas consequências se desconhecem.


3- Numa tenda adequada ao terreiro que construíram frente ao Mosteiro os cidadãos brincaram ao Carnaval. Os forasteiros foram muitos. O concelho voltou a Alcobaça e foi um gosto ver dezenas e dezenas de crianças a divertirem-se na Praça 25 de Abril. A vocação do terreiro é ser um lugar de festa.


4-Parece que finalmente vem aí o Museu do Vinho. O Município vai poder criar um novo núcleo de turismo cultural em Alcobaça.


5-Quando ao Hotel no Mosteiro e todos os outros equipamentos que se desejam há qualquer coisa indefinida no Ministério da Cultura que se está nas tintas para o futuro da cidade. Os pequenos poderes dos burocratas de Lisboa ,delfins do estado centralizado, estão-se nas tintas para Alcobaça e o seu futuro.


6-Na Irlanda e na Grécia houve eleições em plena crise . Talvez não fosse mau que durante a apresentação do orçamento para 2012 considerássemos uma mudança de Governo. E se for antes cá estamos para votar, isto se o sr. Presidente da República passar à prática a teoria crítica do seu discurso de posse pouco apaziguador. Ressalve-se contudo que nos parece que o actual Governo pouco mais poderá fazer com as condicionantes europeias, mas…se seriamente a despesa diminuísse, os Institutos fossem reformados seria preciso acabar aos poucos com a situação dos reformados que auferem esmola estatal, não lhe posso chamar outra coisa.


Já com o texto pronto eis que o alcunhado PEC 4 emaranha a política. O Governo vai a Bruxelas com um cabaz de fruta mas não previne os sócios do pomar. Todos continuam a dizer o mesmo, só o dono da várzea quer terminar com o regadio, mas não o fará porque o presidente do conselho de administração não o deixa levar a sua avante. O grande centro comercial europeu quer a fruta e nós a continuação do pomar em produção. O gerente garante voltar se os sócios o despedirem e aí os trabalhadores terão uma palavra a dizer para salvar a produção num País, Portugal, cujo futuro passa pelo entendimento entre partidos, sindicatos e organizações patronais se não queremos voltar ao descalabro advindo da Guerra Peninsular no sec. XIX ,tendo em consideração naturalmente que as circunstâncias políticas e sociais não são as mesmas. Teremos que nos unir, de exigir que quem governa em nosso nome o faça sem rodeias.


Rui Rasquilho





terça-feira, 15 de março de 2011

M 342 - ANGOLA 15.MARÇO.1961

Para Angola, lentamente, à procura dos mortos da guerra colonial

Liga dos Combatentes tenta localizar os restos mortais dos militares ao serviço de Portugal
Público de 04.03.2011
Por Teresa Firmino
Pedimos aos leitores sugestões de uma história que gostassem de ver publicada no 21º aniversário do PÚBLICO. Entre as sugestões, seleccionámos cinco, submetidas depois a votação entre 22 e 27 de Fevereiro. Venceu a sugestão sobre o Museu do Combatente e os 50 anos do início da guerra do Ultramar.
Uma das fotografias da exposição "Guerra da Ultramar - 50 Anos Depois", que representa as tropas portuguesas em Angola .
No livro de honra da Liga dos Combatentes, o embaixador de Angola em Lisboa, José Marcos Barrica, deixou escrita pelo seu punho uma promessa que responde a um projecto iniciado há sete anos: tudo fazer para que Portugal possa procurar os militares que ficaram sepultados em Angola.
A promessa do embaixador angolano, em Novembro último, numa visita à sede da Liga dos Combatentes em Lisboa, ainda não se traduziu em nada de concreto — para pena do Tenente-General Joaquim Chito Rodrigues, presidente desta instituição tutelada pelo ministro da Defesa. Era por Angola— onde em 1961 rebentou a guerra colonial, que haveria de se propagar às outras colónias portuguesas em África — que Chito Rodrigues gostaria de ter começado o programa Conservação das Memórias.
Lançado em 2003, este programa, em curso, pretende localizar, identificar, concentrar e dignificar os locais onde se encontrem portugueses nos vários cantos do mundo.
E Angola tinha logo sido escolhida para o início dos trabalhos porque, afinal, também foi ali que tiveram lugar os ataques de 4 de Fevereiro e 15 de Março, de 1961, as duas datas mais marcantes do início das guerras contra o colonialismo português.
A 4 de Fevereiro, grupos de angolanos, armados sobretudo com catanas, atacaram durante a madrugada cadeias e instalações oficiais em Luanda. Dos ataques resultou a morte de sete elementos das forças de segurança e de cerca de 15 atacantes, além de um número indeterminado de feridos. A 15 de Março deu-se uma sublevação no Norte de Angola, que provocou a morte de mais de 800 brancos e milhares de negros ao seu serviço. Esses ataques levariam, a 13 de Abril, António de Oliveira Salazar, presidente do Conselho de Ministros, a falar da necessidade de defender a todo o custo a maior das colónias portuguesas e a usar palavras que ficariam célebres: era altura de “andar rapidamente e em força” para Angola.
Evocação a 15 de Março
Os acontecimentos de 15 de Março de 1961, que marcariam o início do fim do império português, vão ser evocados no próximo dia de 15, em Lisboa, pela Liga: às 10h30, será celebrada uma missa no Mosteiro dos Jerónimos, com a presença do ministro da Defesa Nacional, Augusto Santos Silva; às 12h30, o Presidente da República, Cavaco Silva, irá descerrar uma placa evocativa do início do conflito em Angola no Monumento aos Combatentes do Ultramar, junto do Museu do Combatente no Forte do Bom Sucesso; e por fim, às 17h30, poderão ouvir-se na Sociedade de Geografia as palestras de Adriano Moreira e do general Gonçalves Ribeiro, que após o 25 de Abril foi o Alto Comissário para os Desalojados vindos das antigas colónias.
“Não estamos a comemorar, estamos a evocar o esforço da nação portuguesa na guerra colonial, estamos a evocar uma partilha de memórias e a homenagear todos os vivos, os mortos e as vítimas envolvidos no conflito, independentemente do lado por que se bateram”, diz Chito Rodrigues.
Voltando a 2003, a Liga estabeleceu os primeiros contactos com as autoridades angolanas para localizar e recuperar os restos mortais dos militares ao serviço de Portugal. Mas até agora, altura em que se evocam os 50 anos do início da guerra colonial, esse plano não passou do papel.
Num mapa de Angola, repleto de bolas coloridas, foi sendo reunida a informação sobre os militares que lá ficaram, tanto de recrutamento local como oriundos da então chamada metrópole, e os sítios onde estarão sepultados. Entre 1961 e 1975, ficaram lá 1448 militares (586 da metrópole), em 187 locais. Mas é preciso ir a esses sítios ver como estão agora, confirmar a identificação dos restos mortais e depois concentrá-los nalguns pontos de Angola apenas.
“Estamos no momento da partilha de memórias. Deixem-nos honrar os mortos, de qualquer dos lados. Julgava que seríamos compreendidos nesse nosso sentimento — mas ainda não fomos”, diz Chito Rodrigues. “Temos feito esforços por todas as vias. Para nós não há problema, as autoridades angolanas dizem que não há problema. Mas ainda não fomos.”E porquê? “Não sei”, responde. “Queremos ir, mas não queremos invadir nada. Só queremos que as autoridades angolanas nos indiquem um interlocutor, como fez a Guiné e Cabo Verde, para estabelecermos um protocolo de acção e sabermos onde podemos ir”, acrescenta. “Tenho esperança de que ainda este ano Angola seja a próxima acção da Liga, em termos do programa Conservação das Memórias. O embaixador angolano disse-me que teríamos o problema resolvido.”
No livro de honra, José Marcos Barrica deixou registado: “Levamos connosco o sentimento da direcção da Liga e do seu presidente, em particular, de ver realizada em Angola o projecto Conservação das Memórias.” Pode ainda ler-se: “Agiremos junto das competentes instituições angolanas, para que esse desejo manifestado seja realizado, enquanto elemento importante de uma história comum, de uma memória colectiva.”
O tempo encarregar-se-á de esclarecer se estas foram, ou não, palavras de circunstância. Na Guiné-Bissau, o primeiro país onde a Liga avançou com este programa, as palavras traduziram-se em cinco missões, entre 2008 e 2010, de localização das sepulturas deixadas pelo país. Foram também exumados e identificados os corpos de 50 militares da metrópole, pela equipa da antropóloga forense Eugénia Cunha, da Universidade de Coimbra. Os restos mortais de nove já foram trasladados para Portugal, por vontade das famílias.
Ainda durante 2010, entre Julho e Agosto, a Liga avançou com missões idênticas de reconhecimento em Cabo Verde e São Tomé, já terminadas. E em Setembro, fez a primeira missão a Moçambique, onde ficaram 1414 militares (228 da metrópole), em 184 locais. Percorreram-se milhares de quilómetros, para visitar 23 cemitérios em 19 dias, no Norte e Sul do país.


Para 2011, em Junho, está previsto o regresso a Moçambique, com a visita a outros dez locais no Centro. Como o país é extenso, a Liga pretende concentrar os corpos exumados em dois ossários, a construir em Nampula, destinado a 30 corpos, e na Beira. Tendo o ossário de Nampula, e já referenciadas as sepulturas por todo o país, a equipa de Eugénia Cunha começará a exumação, em princípio em Setembro, dos restos mortais em sítios isolados.

Os 10.116 nomes correm ao longo da muralha do Forte do Bom Sucesso — vão desde 1958, já a Índia tinha exigido a Portugal a entrega de Goa, Damão e Diu, até 1975, após o fim da guerra colonial em África. De João Fonseca ou Abílio Castelo Silva até Adelino Coelho ou Zeca Lopes, ou muitos outros recrutados nas antigas colónias, como Abdulai Queta Sumaré e Dabo Baldé. “À memória de todos os soldados que morreram ao serviço de Portugal”, lê-se na muralha do forte, que integra o Monumento aos Combatentes do Ultramar, em Lisboa.


É fácil imaginar que algum destes nomes pode estar corporizado num dos rostos que vemos, já dentro das muralhas que albergam o Museu do Combatente, nas inúmeras fotografias da guerra colonial ali expostas. Todas a preto e branco.


"Guerra do Ultramar — 50 Anos Depois", constituída por fotografias do repórter de guerra Fernando Farinha, cedidas à Liga dos Combatentes, foi inaugurada no mês passado e passa a ser uma exposição permanente do museu. Desde a primeira fase da guerra colonial em Angola, iniciada em 1961, Fernando Farinha estava lá. É assim que nos permite agora ver um grupo de homens cansados da guerra, ou outro a reabastecer-se de água mas com um deles atento ao inimigo, como mostram as duas imagens aqui publicadas em baixo.
Também em Fevereiro, foi inaugurada no museu a exposição Três Frentes em África, com fotografias do Comando de Logística e do Centro de Audiovisuais do Exército. Pode ver-se até meados de Maio. Ora registam a vida na guerra de um grupo de tropas portuguesas em deslocamento pela mata, ora a conversa com os líderes locais, ora o transporte marítimo, a construção de um abrigo, os ferimentos, o banho no mato, a missa, as cerimónias fúnebres, as armas capturadas ao inimigo, ora a chegada a Lisboa.
Organizadas pelo historiador Ricardo Varandas dos Santos, director do arquivo da Liga dos Combatentes, as duas exposições assinalam os 50 anos do início da guerra colonial. Mais do que dar muitas informações sobre cada uma das fotografias, optou-se por criar um ambiente mais poético.


Nos 14 anos de conflito, estiveram nos três teatros de guerra (Angola, Guiné e Moçambique) cerca de 1,3 milhões de portugueses. Nas últimas contas, morreram 10.116. É para honrar o esforço de todos esses homens e das suas famílias que foi inaugurado, em 2007, o Museu do Combatente. Esse esforço, lembra o tenente-general Joaquim Chito Rodrigues, presidente da Liga dos Combatentes, tocou todas as famílias portuguesas.

terça-feira, 8 de março de 2011

M 341 - HÁ CARNAVAIS E CARNAVAIS

TEMPO DE CARNAVAL


O tempo de Carnaval que agora acabou foi vivido e interpretado de diversas formas e maneiras. Para uns foi um tempo para descansar. Para outros foi, quase que por obrigação, tempo de diversão. E divertiram-se : pulando, saltando, cantando, dançando, com máscaras ou sem elas. Menos novos e novos, seniores e juniores, na rua e debaixo de telha, na terra e no mar.



E como quem vai para o mar se avia em terra apanhámos marinheiros preparando-se para enfrentar um céu nublado e um mar chão. O Carnaval passava perto. Na marginal.


Aconteceu em São Martinho do Porto.

JERO

terça-feira, 1 de março de 2011

M 340 - ATÉ AMANHÃ, ESPERANÇA

Até amanhã, Esperança!

 O Tribunal estava instalado no piso superior da Ala Norte do Mosteiro de Alcobaça.
No piso debaixo , no antigo Claustro da Portaria,(assinalada a azul na planta ao nível da entrada)funcionava a cadeia(*). Na entrada da cadeia o carcereiro tinha direito a uma espécie de gabinete e ,numa sala contígua ,estava instalado o espaço feminino da prisão.
 Em 1960, vinham ainda longe os tempos da liberalização do aborto, duas mulheres estavam presas na cadeia de Alcobaça.
 Um aborto nesses tempos quando era descoberto incriminava ,normalmente, quem o fazia – a parteira – e quem a ele se submetia – a mulher grávida. Era o caso.
 No lado masculino da cadeia, que englobava uma dúzia de celas e um pátio de “lazer”, haviam presos a cumprir penas ligeiras, outros a aguardar julgamento e alguns já julgados e condenados a penas mais severas. Que aguardavam transferência para cadeias nacionais(Alcoentre, Leiria, Lisboa, etc).
À distância no tempo poderão registar-se algumas inexactidões mas no essencial poderemos garantir que a história que se segue não é ficção. Aconteceu mesmo.
 Um preso condenado a 8 anos de cadeia, nazareno por nascimento e pedreiro de profissão, era dos mais jovens da “tripulação” prisional. Num dia aziago tinha-se envolvido numa discussão com um colega de profissão e respondeu a uma estalada com o que tinha mais à mão.
 Uma picadeira (um martelo de picar paredes), que não deixou em bom estado a cabeça do seu antagonista, que sofreu um grave traumatismo craniano.
O Colectivo teve mão pesada e aplicou-lhe 8 anos de prisão efectiva.
 O jovem aguardava na cadeia de Alcobaça transferência para uma cadeia nacional.
 É o protagonista masculino da nossa história. Que passamos a tratar por Maranhão.
 A outra personagem da nossa história é a moça do aborto. Que vamos chamar de Madalena.
 Os nomes são fictícios. Com longos dias e meses a cumprir naquele espaço fechado começaram a falar-se junto da porta que os separava.
 A porta do pátio da cadeia, que demarcava a fronteira entre os homens e as mulheres, presos em nome da lei.
A velha porta do pátio era de madeira e tinha fendas.
Algumas já tão largas ,devido ao sol e à chuva de muitos verões e invernos , que davam para conversar e para ter uma visão apertada com quem se falava.

 A porta fechada do pátio cada vez aproximava mais o Maranhão e a Madalena que, com o decorrer do tempo, dos olhares apaixonados se passaram a tocar com as pontas dos dedos.
 Através das fendas da velha porta de madeira.
A rogo do Maranhão a Madalena foi satisfazendo alguns pedidos mais ousados do nazareno. Mostrava-lhe as pernas e outros encantos.
 Estes intervalos de paixão eram interrompidos logo que o  Carcereiro chegava ao seu gabinete.
 Contrariado o Maranhão regressava a sua cela.
E fazia o que podia…aproveitando a solidão possível no preenchido espaço da pequena prisão.
 Mas um dia a tutela prisional ordenou obras na velha cadeia. Repararam-se as celas e caiaram-se as velhas paredes da cadeia.
 Vieram operários, com escadas, baldes de cal e pincéis.
 Num país de brandos costumes os operários foram um dia almoçar fora com o Carcereiro.
E durante a hora do almoço as escadas ficaram no pátio…
O Maranhão viu a oportunidade única de aproveitar uma das escadas para passar por cima da porta.
Para o lado das mulheres.
 E saltou.
Foi um momento de alta tensão.
Tão alta que…algo lhe faltou.
A Madalena amparou-o nos braços e, carinhosamente, fez-lhe voltar algumas das “forças” que o salto tinha feito fraquejar…
 Abraçaram-se arrebatadoramente.
Num minuto de sofreguidão subiram até às nuvens e, de olhos fechados, voltaram à terra.
Um último beijo e o Maranhão “saltador” voltou para o pátio dos homens. As obras acabaram na manhã do dia seguinte e a rotina dos dias anteriores recomeçou.
Conversas e roçar de dedos através das fendas da velha da porta do pátio.
Uns dois ou três meses depois rebentou a “bronca”.
A Madalena teve dores de barriga e hemorragias e necessitou de cuidados médicos. O diagnóstico foi peremptório. Estava grávida.
 A partir dali as dores de barriga da Madalena transmitiram-se também ao  Carcereiro e ao Delegado do Procurador da República, Director da cadeia por inerência das suas funções.
Para apuramento de responsabilidades seguiu-se um processo disciplinar. De que foi escrivão um puto de 20 anos. Então a dar os primeiros passos no mundo do trabalho e …da justiça.
 No registo dos autos e no “registo” das suas memórias não mais esqueceu os rostos, os olhares, as angústias e os relatos dos amantes da velha cadeia do Tribunal de Alcobaça. No espaço do antigo Claustro da Portaria…
 A Madalena foi transferida pouco tempo depois para a cadeia de Tires , um estabelecimento prisional para mulheres.
 O Maranhão foi para Leiria cumprir a longa pena a que tinha sido condenado.
 E , entretanto, o processo disciplinar foi arquivado…
O puto-escrivão de 20 anos foi prá tropa.
 Onde esteve 4 longos anos.
 Na Metrópole e no Ultramar.
 Na guerra da Guiné.
Quando voltou da guerra …voltou lentamente à vida civil.
E cerca de um ano depois de “aterrar”… partiu para outras vidas.
Cheias de …falta de tempo.
 Mas num recanto da sua cabeça, da sua memória nunca se apagou completamente a pungente história de vida da Madalena e do Maranhão. Que lhes terá aquecido?
A Madalena teve um parto feliz? Foi mãe de um rapaz ou de uma rapariga?
E o pai? Cumpriu em Leiria os 8 anos e depois? Terá procurado a Madalena da sua vida de cativeiro?
Passaram 50 anos.
 Na vida nem sempre se encontram todas as respostas.
Terminamos com um voto.
Que dos amores de Alcobaça tenha nascido uma menina.
E que a essa menina tenha sido dado o nome de Esperança.
 E porque a esperança deve ser a última coisa a morrer…
Até amanhã, Esperança!


JERO


Nota-(*) Em 1834, as ordens religiosas foram extintas em Portugal e todos os seus bens nacionalizados.
 A partir desta altura, o Mosteiro é ocupado, reconvertido e adaptado a várias funções públicas e privadas, designadamente: Paços do Concelho, Câmara Municipal, Administração do Concelho, Prisão, Tribunal Judicial, Teatro Municipal (localizado no Refeitório), Caixa de Depósitos, Montepio Alcobacense, Repartição da Fazenda e Finanças, Conservatória de Registo Predial, Escolas de Alcobaça, Quartel (Regimento de Cavalaria 9 e depois Cavalaria 4 e Artilharia 1), Lar Residencial, Biblioteca Municipal, entre outros.